Quando a ficção grita

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- Já que há em ti uma avidez que te faz ser faminto pela veracidade dos fatos, então deixe-me aproveitar deste seu caloroso desespero e me usurparei de suas intenções para lhe deixar ser meu interceptor dos fatos. Já faz um tempo que tenho sido acometida de sucintos encontros, abordagens audaciosas e pedidos vividos por pessoas que tomam os meus caminhos e me acudam os calcanhares para tentarem usufruir de mim a verdade dos relatos, como os tantos os superiores que temos, que preciso que tomem o meu favor, a bem da justiça e da benevolência, portanto, vá à enxertar assim os fatos, que juro pela integra veracidade, aconteceram assim...

"Quando nos encontramos já suspeitava que o destino havia tomado partido pelo caos e escárnio e decidido que a tarde seria de diversão para fofoqueiros e anteverias, e violência gratuita parecia predestinada a ocorrer sobre aqueles pisos de madeira que já haviam encontrado duelo com a intrusa grama adjuntas ao barro nos solados de meus sapatos, contudo, sinal maior não poderia sobrepor o da janela sangrenta sobre o presságio da ira cometida.
A tola, que já tinha deixado claro nos primeiros minutos que a vi que não era mais sã do que eu, estava a negociar com o ceifador no décimo quinto andar do prédio sobre o corpo de um pássaro morto, enquanto a própria parecia posta a abrir assas, de tão inclinada sobre a pátio exposto metros e mais metros abaixo da murada sem proteção, ancorada como se a qualquer momento pudesse tomar vôo.
Havia um pincel, destinado a pintura acrílica, jogado sobre o chão, que não parecia mais vivo apesar de menos inteiro comparado ao pobre animal retido em seu punho, o objeto jazia estalado como se fosse uma de suas prévias vitimas, com gotas e manchas avermelhadas nos pelos que se separavam do cabo, apesar de faltar telas e quadros no ambiente.
Tinta à óleo tão vermelha, que a noite, sobre o luar, seriam traços escuros de um azul como petróleo, em manchas largas sobre um oceano destruído e escurecido por sujeira. Era como se o distúrbio tivesse chegado mais cedo para a peça a ser apresentada, e ansioso, tivesse decidido improvisar o próprio espetáculo, nos dando suas intenções do roteiro que deveríamos tecer para seu divertimento. Apesar de toda a delicadeza que envolvia o primeiro encontro de nossos olhos no instante que entrei no recinto, a possibilidade daquele quarto se tornar uma cena de crime já parecia decidida, e esforcos para apaziguar não nasciam dentro de mim. Como poderia eu me acovardar e me deixar sucumbir perante tão nociva criatura? Não é a educação que tão custosamente meus pais me deram!
Não foi preciso olhar novamente nos olhos para saber que fizemos a mesma aposta, até por que os delas, não iam mais de encontro aos meus, mas manteve-se observando apenas o contorno de minha sombra na parede cheia de cactos iluminados por sol. Ah, a ironia, era quase assim que eu me sentia, como se aquela sombra fosse a minha alma se mostrando. Seus olhos continuavam na parede oposta e eu gostei de apresentar-me assim.
Tão certo estava o destino em criar um futuro de caos, que o primeiro movimento em minha direção não foi o estender de uma mão amiga, mas respingos de toda aquela sujeira.
Claramente, era uma das pessoas que acreditavam que ser impor é o que faz a liderança. No mundo lá fora, em uma organização, uma empresa, uma esfera social, teria dado certo, mas aquela pessoa sem nenhum senso de selvageria, causou uma pena interna no meu corpo. Se logo quando houvesse me decidido ajuda-lá a sair de toda aquela ignorância, não houvesse ocorrido o arrastar do metal se elevando do chão, eu não teria agido felizmente com total escárnio.
Seus músculos rangeram, e alto o bastante para denunciar o movimento, que tentava unir a cadeira e o meu abdômen, numa falha de um movimento que selaria a paixão entre minha boca e o chão. Este seria um romance com gosto agridoce de sangue. E era de tirar o fôlego.
Não se pode vir para cá sem aceitar que um dia sua família receberá uma carta com uma má noticia. Era uma verdade que vinha á mente sempre quando me esquivava do impulso constate que a cadeira fazia, tentando acertar o meu pescoço. Eu ainda não tinha ultrapassado a passagem da porta, e o nível de talento para maldade da minha futura companheira de quarto era decadente, mas ela tinha bons reflexos, e boas panturrilhas para acompanhar meu movimento.
Tentaria não criar uma má noticia para a família de alguém dessa vez.
Desequilibrei o peso do meu corpo, flexionando os joelhos após apoiar o pés nas costelas da cadeira, pouco após uma tentativa recente de me acertar. Com o corpo mais elevado, e trocando o movimento para a força circular, a cadeira se libertou das mãos inimigas e estatelou no chão, agarrei-a em frenesi e a girei, em um ataque que rendeu uma sinfonia cheia de estalos, enquanto a cadeira continuava seu movimento mecânico de vôo até a parede, em uma destruição sonora-visual que cintilaria o metal cheirando a ferrugem e dor-"
- PARE!
O diretor do jornal, um antigo amigo meu, parecia muito cansado com seus olhos avermelhados, em tom quase escuro quanto a palma de sua mão que estava há mais de trinta minutos encostada ao queixo do senhor de 40 anos, sustentando o pescoço, a cabeça e os fardos de alguém que não sabia mais se amava tanto a profissão para se dedicar tantos em tarefas infrutíferas. Ele soltou um longo suspiro e eu quase o acompanhei, pelo cansaço incômodo da cena a frente, que se espalhava pelo ar em cada sacudida de ombros dada. Este pobre adulto, que entrara na idade avançada antes mesmo dos 20 anos, parecia um pouco decepcionado por minha retratação dos fatos.
- Voce não está mentindo para mim, está? - pergunta estúpida, mas continuemos por que preciso sair daqui rápido e acho que nenhum de nos dois ainda vê motivos para a estadia. Certo, interpretarei junto com você nossa saída de cena. Caramba, acho que não tenho que nenhum amigo inteligente.
- Eu? Eu?! Por que deveria? Quando a verdade for espalhada, as mentiras irão contrariar a si próprio, apesar de todo absurdo que os fatos reais possam parecer.
- Está é a coisa menos crédula que se pode disser quando alguém esta mentindo. Sabe, eu não esperava que fosse colaborar, mas sua história está fantasiosa demais, o que me faz supor que lhe falta um tanto de respeito por nos, profissionais. A sua retração faz parece que vocês lutaram até a morte, quando tudo que aconteceu foi ela torcer o tornozelo.
- Torcer o tornozelo E cair do terceiro andar. É, você está meio certo, eu não sou uma pessoa de qualidades muito boas, mas estamos falando de uma situação sobre duas pessoas ruins, você não imaginaria o quão ridículo pode ser quando dois humanos de caráter questionável estão encurralados.
- É, estou experimentando isso em primeira mão agora, mas tudo que ela alegou foi um acidente envolvendo os móveis, por que você está transformando isso em tendência violenta?
- É irônico vindo de uma sociedade que ama ver isso acontecendo na televisão. Se comparar minha versão e a dela, onde foi que eu errei? Cansado demais para escrever, ou é o julgamento que lhe incomoda?
- Você acaba que estamos em uma seção de literatura ou está tentando dispersas as frustrações de uma roteirista dispensada?
- Não estamos em uma seção de debates também, mas meio que estamos continuando com isso, não acha?
Havia chuva caindo longe em algum bairro da vizinhança, apesar do sol quase completamente posto ainda se estendendo, entrando pela sala por meio da janela com vista para a orla florestal, o som de trovões chegando antes da água e fazendo música em um entardecer agitado junto com os raios. A luz azulada do cômodo simples com algumas cadeiras, falhou por um curto instante de segundos, e quando ela voltou a clarear o ambiente, era como se ele já estivesse esquecido de tudo, incluído seu propósito na vida.
- Não parece que o céu está fazendo uma festa? - observou ainda mais cansado e sem esperanças.
- Não, parece que estamos dentro da barriga de um gigante, um faminto, com um longo estômago em rouquidão, e toda vez que o céu brilha com os relâmpagos, é apenas a boca dele se abrindo, colocando comida para dentro. - respondi observando sua canseira se tornar ira novamente, e deboche.
- Nunca choveu comida do céu.
- O gigante está de dieta, ele só bebe água.
- Eu realmente não posso confiar em nada que você diz.
- Será que podemos sequer-
- Não quero saber! - gritou ele me interrompendo-  Vá! Saia daqui! Vá logo que eu não tenho mais tempo! Você tem que crescer, tempo é algo precioso para adultos!
- Quanta ignorância! Eu estava aqui só para TE ajudar! Ingrato!- disse enquanto me dirigia a porta da sala com uma expressão muito fechada e um tanto humilhada - o quê um ser humano precisa fazer para ser respeitado as suas diferenças?!?
- Talvez ser alguém-
- Agora valhe-te! Não quero saber também! Tornei-me ignorante igual tu! Dizem mesmo que não podemos nos unir a certos alguém! Uma maçã podre deixa todas as outras igual a ela - apresso o passo até a saída, franzo o cenho, e lhe dou rápidas olhadelas de reprovação, que espero cheguem até o fundo das íris de seus olhos.
- Não use isso como uma oportunidade para se fazer de atriz! E você não precisa copiar os meus maus hábitos! - ele gritou antes da porta se fechar, por meio do lance de visão entre a fina fresta.
- Então você deveria se esforçar e ser um exemplo! Advinha só?! Você não tem nenhum bom para copiar!
BAM! Estrondo de madeira velha fechando, pois costumo ser dramática quando estou saindo, mesmo que meus sentimentos e emoções estejam o contrário do que mostro, eu me divirto em tentar adivinhar se a pessoa do outro lado está fazendo o mesmo: interpretando, me ajudando com a cena, tentando fazer a vida bucólica. Acho que somos tentados naturalmente a interpretar quando notamos o palco montado pela outra pessoa, será que nos sabemos quando estamos sendo honestos com o nosso comportamento? E por que ficamos frustrados quando sabemos que ambos são atos? Desço as escadas em direção ao jardim de inverno, e como as árvores embaixo, busco mais sobre mim mesma em minhas raizes.

Eu teria que revelar coisas que não queria, para cobrir as que causaram maior impacto, lhes deixei confusos para criar uma revolução e ninguém seria capaz de chegar em consenso sobre uma opinião do que eles poderiam fazer de meus testemunhos, lhes contei verdades simples que o deixaram incrédulos, e algumas mentiras tão bem contadas que os fariam duvidar de minhas reais construções das cenas, que ainda seriam de ser contadas á televisões, programas de rádios, jornais, revistas, e outros bilhões de ouvidos que pareciam não entender o quão confuso estava o mundo para a ver a falta de razão nas minhas palavras, mas noticias mesmo feitas, não serão enviadas.

Excessos E DevaneiosOnde as histórias ganham vida. Descobre agora