Capítulo 4

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          Há praticamente um mês Rebeca sentia o cartão dado por Miguel queimar em seu bolso, já havia pego o telefone para ligar mais vezes do que podia contar, mas sempre desistia no final. Já estava ficando gasto e manchado, mas ainda assim ela não conseguia chegar a uma conclusão. A oportunidade parecia boa demais para ser verdade.

- Se eu ver você com esse cartão na mão mais uma vez eu mesmo pego e ligo para ele hein! – Diego falou flagrando-a em um dos momentos de reflexão.

- Nem preciso mais dele, já decorei o número – riu nervosa – Mas eu não posso... Eu quero, mas não posso – falou baixinho.

- Se um gato daquele me oferece um emprego eu não estava nem aqui mais amiga, não sei o que está esperando! Caras como esse não caem do céu. Aproveite a oportunidade!

- Mas já faz um mês... Ele nem deve estar lembrando mais... – suspirou.

- Aposto que está, mas não vai esperar para sempre. Pense bem. – disse pegando alguns livros e saindo em seguida.

          Naquela noite Rebeca não conseguia dormir, alguma coisa estava errada, seu corpo formigava e sentia uma pressão no crânio que parecia espremer seu cérebro. As luzes do quarto piscaram, as vozes recomeçaram e não era só isso, podia senti-las, quase tocá-las.

           Um som agudo tomou seus ouvidos, um grito, um grito de dor e pânico, não via mais nada, tudo ficou escuro. Quando acordou a casa estava alagada, todos os itens de vidro haviam estourado e havia água por todo lado, podia apostar que estava salgada, como todas as vezes. O pior é que ela sabia que ninguém mais havia ouvido, mas mesmo assim era real, ou as janelas, garrafas e todo o resto não estariam estilhaçadas pelo chão.

          Pegou o celular cujo vidro estava estourado e discou sem pensar duas vezes. Devia ser mais de duas horas da manhã, não era um horário apropriado entretanto a única coisa em que conseguia pensar encolhida em sua cama no meio de todo aquele caos era que cada toque demorava tempo demais.

Aquela voz grave e aconchegante atendeu no terceiro toque.

- Rebeca? – perguntou. - Como ele sabia? A pergunta passou pela sua cabeça em uma fração de segundos. 

- Eu preciso de ajuda – foi a única coisa que disse antes de perder a consciência mais uma vez.

         E lá estavam eles, os portões altos e imponentes em meio à neblina. Podia sentir o cheiro forte daquela terra molhada pela chuva fina e fria que caía. Sabia que alguma coisa ia acontecer em meio aqueles túmulos abandonados, cheios de limo. Em algum momento os portões se abririam, estavam se abrindo, eles nunca se abriam...

- Rebeca – ouviu uma voz chamar ao longe, uma, duas, três vezes, e então uma luz extremamente forte a cegou. Acordou suando frio em sua cama, Miguel estava ao seu lado, parecia estar sussurrando algo em seu ouvido.

- Miguel – disse baixinho. – É você mesmo. – Ele estava muito sério quando assentiu.

- Você fez uma bagunça e tanto aqui menina – disse olhando ao redor, descontraindo um pouco.

- Não sei o que aconteceu – disse tentando se levantar sem sucesso. – Mas você veio.

- Estava esperando a sua ligação – sorriu

- Você é algum tipo de vidente? - falou com dificuldade, tentando ser divertida.

- Quase isso – respondeu no mesmo tom.

A Última Lágrima do AnjoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora