O turno seguinte seria no terceiro bloco e eu não tinha mais horários em comum com Annie, mas ela fez a gentileza de pedir a um amigo para me levar até lá. Ele se chamava Austin, um tipo alto, atlético, comunicativo e descontraído — resumindo, um estereótipo colegial ambulante.
Sentamo-nos lado a lado e, em determinado momento, ele me cutucou para perguntar:
— Curte futebol? Há vagas no time e seu biótipo é adequado.
Tirei o olhar da blusa fluorescente da professora de filosofia e fitei-o.
— O que isso quer dizer, exatamente?
— Que você parece aguentar uns trancos.
— Ah, entendo, mas esportes não são a minha praia.
— Sem essa, é tudo questão de querer — ele retrucou. — Um treinador competente, e rotinas eficazes, pode transformar qualquer idiota num idiota que sabe lidar com bolas. Não leve isso para o lado sexual.
Rimos de bocas seladas, evitando eventuais protestos da educadora.
— Obrigado, mas prefiro continuar com meus ossos intactos.
— Compreensível. Pelo menos, assista a um treino. Vai ver você mude de ideia. Qual será sua próxima aula?
— Economia.
— Descolo um passe livre para você, topa?
Hesitei; o tema realmente não me agradava. Por outro lado, poderia ser legal assistir aos caras gladiando por uma bola e, de quebra, faturar uma horinha para realinhar os pensamentos, então aceitei o convite.
Durante a peregrinação ao campo, Brigth, baixinho de cabeça raspada e comportamento hiperativo, juntou-se a nós. Sei lá como, em três minutos, ele descobriu até a cor da minha cueca — em pensar que tudo começara comigo lhe dizendo as horas.
— Então você é amigo da Annie?
— Não, eu tava perdido e ela me levou à secretaria, à sala e ao Austin.
— Pretende investir?
— Hein?
— Cair pra dentro, chegar chegando, meter o pé na porta. Sacou? Não? Tipo, aproveitar o momento; você é o carinha novo, simpático e bonitinho, então as garotas tendem a prestar atenção. Você pode usar essa influência para ser o pegador do semestre ou redirecioná-la somente à Annie que, cá entre nós, vale a pena. — Brigth fez uma pausa, recobrando o fôlego, depois acrescentou: — Se escolher a segunda opção, considerando que ela é minha prima e eu a conheço razoavelmente bem, posso te fornecer informações valiosas, por uma quantia justa.
— Ignore — Austin aconselhou-me.
— É brincadeira — disse Brigth, rindo, escorando-se em mim. — Mas, se você mudar de ideia, e tiver cem pratas sobrando, estou à disposição.
Chegamos ao protótipo de estádio, guarnecido por hectares de grama tratada, gaiolas recheadas de bolas, aparelhos de treinamento, bandeiras hasteadas, arquibancadas vermelhas e um painel eletrônico que representava um Falcão Negro prestes a içar voo.
— Legal, né? — Austin fisgou meu fascínio. — Os contornos cintilam em jogos oficiais e, se ganhamos, ele fica dourado durante dez noites.
— Isso quase me faz querer jogar — admiti.
Conheci mais três integrantes do time titular, cujos nomes logo esqueci, e descobri que Austin não só era o capitão, mas também o tal filho do meu vizinho/publicitário/montador de móveis para mães solteiras — informação que não me surpreendeu; Jeff induzira mamãe na triagem da casa, era de se esperar que fizesse o mesmo quanto ao colégio para o qual me chutariam.

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Quando Acabar
Teen FictionComo se defender quando você é o inimigo? São perguntas como esta que fazem Liam perder o sono ou, simplesmente, desejar não tê-lo. Lá está ele; nova casa, cidade, país; levando na mala a chance de reconstruir a vida antes danificada; encarando com...