Capítulo 33

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Lorde Rupert encontrou a esposa lendo próximo da janela no aposento que ocupavam no Castelo Branco. Uma brisa suave soprava em seus cabelos e ela demorou a notar sua presença, então lhe sorriu e foi até ele. Observou o rosto do marido, numa tristeza que havia anos que não via da maneira que estava visível agora. Lady Marian o abraçou e ele sabia que não tinha como esconder sobre de onde estava vindo e com quem esteve, mesmo que isso fosse mais um duro golpe, pois ele certamente não seria piedoso com a mulher que lhe deu à luz. Temia inclusive que fosse cruel com ela. Mas, Marian não iria perdoá-lo se tempos depois, de alguma forma, viesse a saber que esteve tão próximo de Arthur, e não teve sequer a chance de ver como ele era, de ouvir sua voz, de pelo menos chegar perto do filho após tanto tempo. Fez com que ela sentasse onde estava antes, e apoiou-se num dos joelhos, percebendo que ela ficava mais preocupada a cada detalhe que ele lhe dava. Por fim, viu seus olhos marejarem e ela chorou como não chorava haviam anos.

Ela pensava em tudo que seu filho poderia ter passado em seus anos em Ullyan, e aquilo parecia querer consumi-la. Deveriam ter tentado mais, deveriam ter convocado os Elders mais vezes, aquele portal deveria ter sido aberto de alguma forma. Tinha que vê-lo. Seu Arthur era um bebê tão tranquilo, um lindo menino tão esperado, e que lhe foi tomado pelo feitiço do portal, nascidos dentro dele, não sobreviviam muito tempo em Ambarys. Assim como ambarianos não sobreviveriam muitos dias em Ullayn. Naquela tarde fatídica, estavam chegando a Ihgraime depois de passarem alguns dias em Maherac, havia sido logo após o ataque ao príncipe Noah, quando Kael, ainda numa forma tenebrosa, conseguiu atravessar o portal. Entrou no Castelo Branco e tentou matar o primogênito do Rei Elran. O menino percebeu algo estranho e saiu correndo pedindo pelo pai, que para sua sorte escutou o seu chamado e foi ver o que estava acontecendo. Como percebendo que algo errado estava acontecendo, seu marido seguiu o Rei, que depois de proteger o filho usando a Marca Ambariana, ficou indefeso perante o espectro que era Kael, salvando pai e filho e enviando-o de volta para Ullayn. Mas infelizmente, na tentativa desenfreada de abrir o portal no castelo, Kael havia aberto em outros locais, e encontraram um desses próximo de Ihgraime. Na tentativa de fechá-lo, foram atraídos para ele. Lá, horas depois, deu à luz a Arthur, que por conta da maldade de Kael, havia nascido ullayner. Miranda, a mulher que os acolheu, cuidou do bebê quando não conseguiram atravessar com ele, pois se permanecessem ali, também não sobreviveriam por muito tempo. Eles estavam em busca de uma forma de trazer Arthur para Ambarys, e diversas vezes conseguiram abrir portais para ficar algumas horas com o bebê. Mas, quanto mais o tempo passava, mais difícil se tornava abrir portais. Até que um dia, não abriu, nem no outro, e assim passaram-se mais de vinte anos, de tentativas constantes, agonia, tristeza, e uma perda que jamais foi reparada. Um lugar que somente Arthur poderia preencher. Lyra era maravilhosa e a amava mais do que tudo no mundo, mas ela não substituiu o irmão em nenhum momento, talvez tenha deixado tudo um pouco menos difícil com sua presença, mas ainda não tinham Arthur. Ainda era muito doloroso.

Ele sabia que não poderia impedi-la de descer a masmorra, e foi com ela até lá. Ela demorou a entrar, pensativa sobre como começaria a falar com ele. Seu coração batia acelerado e suas mãos estavam suadas. Por um momento duvidou que conseguisse falar algo para ele. Sabia que aquele poderia se tornar um dos momentos mais felizes de sua vida, como um dos mais tristes, também. Por fim, ela iluminou o caminho e começou a descer a escada que a levaria às celas. Passou as mãos suadas pelo vestido, e depois pelos cabelos. Não que aquilo fosse fazer diferença, pois ele a veria com a cara inchada de tanto chorar, sua cabeça doía. O marido apontou a cela adiante e ela caminhou devagar até lá, parando, nervosa, e viu um vulto sentado junto às grades. Com um aceno colocou a esfera de luz um pouco em direção de onde ele estava, pois queria vê-lo. Arthur olhou na direção dela e levantou-se rapidamente.

- Lyra?

- Não, Arthur. Meu nome é Marian, e eu sou sua mãe.

Ele aproximou-se dela. Nunca lhe falaram como era, costumavam falar apenas do senhor do castelo. Chegou a questionar se ela ainda vivia. Achou-a idêntica à Lyra. Era linda e estava com a mesma expressão confusa de Lyra depois que a havia ajudado a derrotar Hainor. Ela perdeu-se olhando o belo rapaz que seu filho havia se tornado. Havia ouvido que ele não usava magia, mas que era um arqueiro habilidoso e certeiro. Ele ouvia calado ao que ela dizia, talvez fosse a única vez que pudesse ouvir a voz da sua mãe, mas ainda assim era difícil acreditar no que ela dizia. Ela destrancou a cela e entrou para vê-lo de perto, e o arqueiro baixou a guarda pela primeira vez depois de ter sido capturado. Deixou que ela tocasse seu rosto e teve vontade de abraçá-la, mas resistiu, porque ainda assim ela o havia deixado, tanto quanto seu marido. Tanto Miranda quanto Colin haviam lhe ensinado que as mulheres deveriam ser tratadas com respeito, e acreditava nisso. Não poderia tratá-la mal, porque ela ainda era a mãe de sua irmã, e lhe parecia uma boa mulher. Falou de forma educada, mas firme, que não os perdoava. Lyra nem imaginava que eram irmãos, que estava se aproximando dela e sempre estaria por perto quando ela precisasse dele. Viu Lorde Rupert e Sirius parados na porta da cela, e o lorde graime disse que poderia ir, que estava livre. Sirius entregou-lhe a aljava e o arco, afastando-se para que ele pudesse passar. Arthur olhou uma última vez para Lady Marian e saiu a passos rápidos e silenciosos pelo corredor da masmorra.

Estava indo em direção aos muros que pretendia escalar para evitar passar pelo salão principal. Passou, olhando para os lados quando viu, não muito longe dali, algo muito estranho acontecendo. Lyra estava conversando com Noah e os dois passeavam pelos jardins do castelo e ele viu Kane caminhando em direção a eles de adagas em punho, e ele não parecia estar para brincadeira. Noah estava desarmado. Se aquilo fosse sério, ele mataria facilmente os dois. Viu Lyra perceber algo e voltar-se para Kane, que se aproximava. Ela teleportou a alguns metros dele perguntando o que estava acontecendo. Foi se aproximando de onde eles estavam. Não deixaria Kane encostar num fio de cabelo de Lyra. Armou o arco e puxou uma flecha que passou zunindo pelo príncipe, fazendo-o recuar, dando a chance de Noah acertá-lo. Mas era Kane, e definitivamente aquilo não seria o suficiente para fazê-lo parar. Ele se esquivou de Noah, que o acertou numa segunda tentativa com um soco no queixo, certo de que seu irmão deveria estar dominado por algum feitiço. Ele voltou-se para Lyra, que ainda observava, atônita, o que estava acontecendo, e lhe atirou uma faca. Arthur desviou com o arco, colocando-se entre ele e Lyra. A Morte Escarlate passou a poucos centímetros dele, que viu Lyra convocar o cetro e defender-se do ataque do príncipe. A maga pedia para Kane parar, e quando ele voltou a se aproximar, Arthur sentiu algo diferente acontecendo. Tão rápido quanto Kane, ele moveu-se contra o príncipe, acertando-o no peito como se sua mão sequer tivesse tocado nele, arremessando-o alguns metros e deixando-o desacordado. Lyra reconhecia aquilo. Era magia de combate, e poderosa, mas ela percebeu que ele estava surpreso, talvez tenha se manifestado somente naquele momento. Ela juntou o arco caído no chão e o viu transformar-se assim que ele tocou na arma. Uma que ela sabia muito pouco sobre. Um arco chamado Bastardo. Diziam que sua corda era feita de magia pura e que com o passar do tempo, o portador não precisaria de flechas, pois seus tiros seriam mágicos e mortais. O arco prateado com pedras âmbar e esmeraldas era algo tão lindo que não conseguia parar de olhar para ele. Viu Lyra olhando, parada a sua frente.

- Ora, uma conquista e tanto! - Ela olhava admirada para o arco. - Devo chamá-lo de herói?

- Do que gostaria de me chamar? - Ele estava confuso, olhando aquela arma, não se achando merecedor de algo como aquilo. Principalmente depois de tudo que fez.

- Foi você mesmo? - ela perguntou, olhando-o nos olhos, vendo-o assentir silenciosamente. - Eu queria entender porque. O que meu pai poderia ter feito de tão grave para você desejar feri-lo, até mesmo matá-lo.

- Eu preciso ir. - Ele viu pessoas se aproximando, certamente para ver como estava Kane, e tentar tirá-lo dali. - Mas eu prometo que quando eu voltar, e eu vou voltar, lhe contarei tudo. - Ele passou a mão pelos cabelos dela e muito veloz, foi escalando o muro do castelo, até ela perdê-lo de vista.

- Arthur. - Ela voltou-se para onde ele foi, mesmo sabendo que ele já havia partido. - Espero que quando você voltar, seja para ficar.

Loyalty - Reclamada Pela Realeza - Duologia AmbarysOnde as histórias ganham vida. Descobre agora