05 de Novembro de 1925

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05 de Novembro de 1925

O dia raiou me trazendo preocupações. Toda a tribo está em preparações para batalha, e pelo passo acelerado temo que não esteja muito longe no horizonte.  Acaua foi impedido de se juntar aos esforços de guerra por ser muito jovem, e tem que ficar de guarda para mim. Seu humor está péssimo hoje, e não está aberto a conversação. Discorda dos anciões e quer muito estar na linha de frente.

Me compadeço do menino, não por ter sido proibido de participar da batalha, mas por acreditar que conflitos e matança são algo honroso. A humanidade não mede esforços para mandar jovens ainda nem bem formados para matarem uns aos outros. E vejo que a propaganda de guerra acontece em todos os níveis culturais agora. A história se repete em todo canto. Nós, os "anciães", que deveríamos cuidar do futuro desses jovens, os mandamos para o abatedouro e nos escondemos atrás de mesas confortáveis e seguras. Espero que a sua geração haja de melhor forma, Marie.

Acho que não teremos troca de histórias hoje.


05 de Novembro de 1925 - Parte II

Tive uma longa conversa com o alemão pela tarde. Me diz que seu nome é Harald, mas não depositei muita fé na informação. Ele não me parece uma pessoa sincera, por algum motivo. Harald me questionou sobre meu Quando inicial sem rodeios. Ele sabe que cheguei pela aldeia e sabe do que ela é capaz. Me disse também que era um padre e estava em busca de algo, como todos nós. Não sei qual é o seu Quando original.

Quis saber das minhas motivações para estar ali, mas nesse quesito demonstrou pouco interesse em insistir quando me neguei a dar-lhe uma resposta. Estava muito interessado no inglês, a quem acabei de descobrir que se chama Percy. Insistiu muito no assunto. Queria saber a natureza de nossa relação (nenhuma), o quanto sabia sobre ele (nada) e principalmente sobre o seu atual paradeiro (nem ideia).

Harald está perseguindo Percy porque lhe roubou as anotações que utiliza para navegar com a aldeia pelo tempo. As anotações que estavam comigo, estou certo. Mesmo que tivesse a inclinação de devolver-lhe o caderno, o que não tenho, elas ficaram escondidas na aldeia. 

Minha falta de respostas o desagradou, e não fez questão de esconder esse fato. Admito que estou um pouco preocupado com isso, porque agora que não pareço ter grande utilidade para ele, não sei até quando sua hospitalidade se estenderá.


05 de Novembro de 1925 - Parte III

Estive o observando hoje pela aldeia. Com as preparações para a batalha e a presença de Harald, os índios não parecem tão preocupados comigo. Pude sair um pouco, sem me afastar da oca, pela tarde. Não percebi maus tratos de Harald com os índios, mas o medo que tem da sua figura é perceptível. 

Ninguém o olha nos olhos, nem discordam ou questionam suas ordens. Ele me lembra o velho policial Antônio que patrulhava nosso bairro quando você era pequena. Você lembra, Marie? Era uma pessoa tranquila a maior parte do tempo, mas quando era contrariado, era pólvora acesa em um barril. Todos andavam com medo e pisando em ovos na sua presença. A traição de um olhar desconfiado era o suficiente para instiga-lo. 

E isso é o que o padre Harald me parece. Um barril de pólvora esperando para explodir a qualquer momento.

Vou tentar me manter fora do seu radar. Mas preciso sair daqui com urgência. Não me sinto seguro nesse lugar.

Queria o seu conselho, Marie. Não sei o que fazer. 

O Diário de Igor Jankov (Pausado temporariamente)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora