Capítulo 4 - Fernando Pontes

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Fernando Pontes seguia o estereótipo do homem de sucesso convencional. Tinha quarenta e oito anos, uma linda casa e uma esposa bonita. Um carro utilitário de classe média alta, uma rotina de trabalho consideravelmente folgada, um cargo público cobiçado como chefe do 78º Distrito Policial da Polícia Civil de São Paulo e uma série de problemas, tão convencionais quanto sua ascensão social.

O seu primeiro problema era que ele não era exatamente o tipo de pessoa que fazia amizade por onde passava. A sua gradual evolução na carreira foi conquistada com trabalho duro e foco na objetividade, não necessariamente com amizades sinceras e trabalho em equipe. Seu egocentrismo profissional não o ajudava a fazer amigos.

Fernando residia no Jardim Paulista, um bairro relativamente nobre da cidade, que compõe o conjunto dos "Jardins". Sua casa ficava no centro da rua principal de um condomínio fechado. Toda a parte externa era branca e a garagem ladrilhada. Seu utilitário compacto se encaixava como uma luva no design da casa que, por dentro, parecia um demonstrativo de marketing da Tok&Stok.

Logo que Fernando se formou em Direito e terminou sua especialização em Administração Pública, entrou por meio de um concurso público para a Polícia Civil e encontrou ali a sua felicidade profissional. Começou com uma função semelhante à de auxiliar administrativo em uma delegacia e galgou degraus enquanto era transferido entre as estações de trabalho. Depois de passar por várias chefias e não ter mais para onde ir, decidiu prestar novo concurso e alcançou o tão sonhado posto de delegado. O que ele realmente gostava depois de ter avançado em sua profissão era de não ter a necessidade de passar todo o tempo imerso em papéis e processos administrativos caso desejasse. Vez ou outra, passava pelo departamento de aquisições, departamento de crimes, departamento de relações públicas, atendimento de emergência e tinha a oportunidade de conhecer as diversas formas de trabalho da delegacia.

Existem dois pontos importantes sobre a vida de Fernando. O primeiro é o fato de sua idade provocar efeitos, no mínimo, curiosos sobre a sua personalidade. Um homem bem-sucedido, aos quarenta e oito anos, começa a ver que tem tudo o que quer, e esse comodismo tem um poder destrutivo absurdo sobre a personalidade de qualquer pessoa. Nenhum ser humano suporta olhar para os lados e ver que não tem mais o que fazer, que não há mais nada para comprar ou que não há mais nada a se conquistar. A realidade é que frustrações, problemas e sonhos são combustíveis para a nossa vida, e suas ausências podem destruir nossa paz.

Fernando estava numa fase da vida em que não estava contente com o casamento, e isso vinha trazendo vários problemas. Em um dos seus dias cinzentos em casa, sua mulher o chamou para uma conversa séria e mostrou alguns exames, confessando que era estéril.

O sonho de construir família não era uma realidade muito forte na vida de Fernando até a meia-idade, contudo, ele realmente criou essa expectativa quando passou dos quarenta anos. A notícia de que sua esposa não poderia ter filhos o deixou sem muitas perspectivas na vida. Psicologicamente falando, filhos são uma continuação natural da vida. Quando tudo já está estável e organizado, eles vêm para dar trabalho, problemas e uma doce dose de vida.

Após a notícia, Fernando tentou não se abalar e conversou com alguns colegas que não haviam se casado ou resolveram não ter filhos para ver o que eles faziam. A maioria disse que havia investido nos seus hobbies. Alguns viajavam para diversas partes do mundo, outros estavam sempre nas baladas joviais da cidade, pagando algum carro esportivo ou inseridos na compra e venda de terrenos, como investimento financeiro. Nessas horas, ele via como estava estagnado na vida. Começou a buscar diversões alternativas, desde a forma mais rebelde, como comprar uma moto de alta cilindrada para se sentir livre, até se envolver sexualmente com mulheres mais novas e preencher a lacuna que sua esposa havia causado com o seu problema médico.

Dois FragmentosWhere stories live. Discover now