Capítulo 24

68 1 0
                                    

Danilo

Não fiz o que fiz para afrontar a Mandy, embora ache que ela vai pensar isso.

Quando ela fugiu eu não consegui olhar para o senhor à minha frente e virar as costas e deixá-lo lá sozinho e com a cara de sofrimento estampada no rosto.

Sem muito me alongar oferci a minha casa. Oferci minha casa de banho. Oferci tudo o que era preciso para aquele homem barbudo e sujo se limpasse e sentisse um homem digno outra vez, apesar de achar que dignidade é mais do que roupas limpas e barba e cabelo feitos.

No final de tudo, depois do senhor Ricardo usufruir do meu quintal para cortar a barba e o cabelo, e se lavar um pouco, foi para a nossa casa de banho e quando saiu, parecia um homem novo e percebi o principal motivo por que fiz aquilo: meu pai.

Como gostava de ter mais uma oportunidade com ele. De lhe poder oferecer alguma coisa. Só mais uma chance, oportunidade. Era só isso que pedia.

- Muito obrigada, Danilo. Sinto-me como novo.- Disse o meu sogro? É, meu sogro, afinal é pai da minha namorada. E sentou no sofá ao meu lado.

- De nada, acho que você precisava, não é mesmo?- Percebi que ele era parecido com a Vicky. Olhos e cabelos iguais. Acho que a Mandy parecia com a mãe.

- Já lá vai muito tempo que não tomava um banho.

- Bem, queres algo? Cerveja, vinho... -  Ele olhou estranho para mim.

-Ela não te contou, pois não?- Ela? Será que queria dizer a Mandy?- Tudo bem, acho que aceito uma água.

- Nada disso. A Mandy fez um sumo de maracujá muito bom ontem e um bolo de chocolate, vou buscar.

Levantei e andei até à cozinha não sem antes ouvir um murmúrio dele dizendo:

- A minha menina continua igual... O que eu perdi....

Sendo que a última parte foi um suspiro doloroso e quase inaudível.

Peguei tudo o que pretendia, confesso, intrigante por não ter percebido porque ele não preferiu uma bebida alcoólica. E também ao facto de me ter falado se ela não me tinha contado algo.

Quando já tinha a bandeja na mão ouvi que a minha Mandy chegava. Apressei me pois ela ia fazer cara feia.

Dito e feito. Ela estava na porta parada quando entrei e vi-a olhar diretamente para o pai. Eu consegui decifrar tudo o que se passou pela sua cabeça. Primeiro que me ia matar, depois o espanto pelo homem sentado no sofá e por fim o amor que mesmo ela não querendo sentia pelo pai. Porque país amamos logo à partida sejam bons ou maus. Só aumenta o nosso afeto consoante melhor forem.

Pousei rapidamente a bandeja e fui ao socorro dela. Peguei-a pela mão e fi-la sentar no sofá à frente do pai. Eu sentei no braço do sofá. E falei:

-Desculpa amor, não te ter dito, pois sei que não verias. Precisam conversar. Se quiseres posso subir e drixar-vos à vontade.- Olhei para o Ricardo e ele parecia ansioso e só assistia. Ainda não tinha dito nada.

- Fica, fica.- Ela agarrou-me tão forte e juntamente que o seu sussurro suplicante, pensei que nunca a deixaria ali sozinha. Voltei a sentar-me e pus um braço nos seus ombros. E ela enconsta-se mais a mim. E olha para o pai.

- Queres ouvir-me? Não te quero obrigar a nada.- Pronunciou reticente o pai dela.

- Já que estou aqui... Tanto faz. -  Ela deu dos ombros e olhou para mim acusatoriamente, eu era o culpado por ela estar ali. Todavia ela queria não dar importância mas dava.

- Não há desculpas possíveis pelo que fiz. Nada apagará o que perdi. Arrependi-me todos os dias da minha vida. Mas algo, melhor alguém, faz ia-me sentir menos preocupado: o Roberto.- Ela espantou-se e ele sorriu um pouco. -  É Armanda, eu sabia que ele cuidaria bem de vocês. Mas bem, falando do motivo pelo que fugi, desapareci, abandonei-vos... Bom, a empresa começou a afundar e eu era um dos que tinha corda no pescoço, ou baixo de cargo ou era demitido e isso aconteceu num momento mau. Eu estava amedrontado. E meti-me na bebida, por isso chegava em casa muitas vezes bêbado em casa. Se isso tudo é desculpa? Não, aliais jamais. Mas deu-me um desespero tão grande de não conseguir aguentar, e por vocês eu desapareci pensando que era melhores para vocês... -  Ela interrompeu-o.

- Meu Deus. Eu senti tanto a tua falta. A Vicky ficou arrasada, a minha mãe quase entrou em depressão. A sério que isso era melhor para nós, pai?- Ela já estava a chorar. Eu senti que aquilo estava a ser mais difícil que ela estava a mostrar. E apertei o ombro demonstrando força.

- Tu chamaste-me pai. Oh meu Deus, agora posso morrer feliz.- Por estranho que pareça ele estava mesmo feliz e lágrimas escorriam pelo seu rosto. A Mandy só olhou para mim espantada. -  Eu sei que perdi muita coisa, e me arrependo muito, demais. Peço desculpa por tudo. Precisava do teu perdão e da tua mãe e da Vitória. Se calhar não vai ser possível falar com elas, no entanto falar contigo já foi bom. Diga-lhes que sinto muito, diga a tua mãe que a amei muito, continuo a amar mas de uma forma diferente. E à tua irmã que ela será sempre a minha princesa. Assim como tu. -  Ele levantou-se e foi até mim.- Obrigado por cuidares tão bem da minha menina. Continua assim e obrigado também pelo banho. Agora já posso morrer em paz. -  Ele começou a caminhar em direção à porta. Ela levantou rapidamente soltando:

- O que é que se passa?

- Nada, filha. Mesmo que não me perdoas, já estou mais tranquilo. Não feliz, mas melhor. E preparado. -  Começou a andar e ela parou-o de novo.

- Preparado para quê? Não adianta. Não sais daqui sem me dizer o que se passa.

- Sempre a mesma. Mas nem eu sei ainda Carol. Preciso ir ao hospital. É só isso que posso adiantar.

E ele saiu, deixando no ar algo que não contou.

Mandy

Será que ele está doente? Claro que sim. Por isso fugiu de nós. Por isso teve medo.

- Vamos atrás dele. Ele está doente Dan. Por favor, leva-nos ao hospital.

Supliquei ao Danilo e ele agilizou e ainda encontramos o meu pai Ricardo pelo caminho. Paramos ao seu lado.

- Entra nós te levamos ao hospital.

*

Uma hora e meia depois pairava sobre nós o medo que o meu pai sempre teve: o cancro. O seu pai e avô morreram da doença e isso tende a ser hereditário.

Aquilo era demais para mim. Apesar de tudo, eu queria o melhor para o meu pai. Apesar de tudo, ele ainda era importante para mim, ainda o amava. Por isso doía tanto o seu abandono.

Eu tinha que agradecer ao Danilo depois, ele estava a ser perfeito. O apoio, a presença dele estava a dar-me forças. Meu pai Ricardo explicou-me que os exames já deviam ter sido feitos muito antes, antes mesmo de ele desaparecer.

Eu esqueci toda a dor e a sua ausência. Só me foquei na sua saúde.

Ele fez todos os exames que tinha que ser feitos e saiu desnorteado, acho que finalmente ele demonstrava o medo do diagnóstico.

- Agora é esperar até próxima semana. - Ele disse desanimado.

- Esperaremos. Tens fome? Acho que não comeste o que o Danilo te deu.

- Falha minha filha. O teu bolo e sumo de maracujá, sempre foram bons.- O pequeno sorriso que ele deu foi bom para mim. Mais do que podia imaginar.

- Tenho uma sugestão- pronunciou o meu amor- há um café que serve um bom bitoque aqui perto.

Acabamos todos mais descontraídos a jantar. Já era tarde. Estava tudo bem, até meu pai resolver falar:

- Preciso avisar-vos de algo. É sobre o Bruno.

Eu e o Danilo nos entreolhamos confusos e expectantes ao mesmo tempo. Ele falou:

- O que tem o Bruno?

O outro lado do amorOnde as histórias ganham vida. Descobre agora