O Andarilho Sem Nome

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              Estive andando por muito tempo...Carregando todo fardo de ser mais um dos homens vazios e sem coração nesse mundo apodrecido. Apenas carrego comigo roupas puídas e uma bolsa da qual carrega um livro e uma pena com tinteiro...Começo a escreve-lo pois tenho tido visões em meus sonhos mais profundos  nas últimas noites que foram gélidas...

              Sem enrolação, vou contar o porque de tudo isto acontecer e o porquê de vivermos na miséria...Outrora houverá um homem poderoso, ele carregava consigo a ambição...o desejo profundo que permeia a alma de cada um de nós como indivíduos pensantes. Então ele tomou estas terras para si, usando aço e soldados, enormes exércitos que vieram e assassinaram os nativos. Mancharam o chão com sangue e carregaram sobre si o pesado peso da vitória. A partir disto um fértil e próspero reino emergiu das sombras do que antes era uma guerra... Tudo o que todos sabemos é que um forte sortilégio veio a repousar sobre estas terras e o que antes era um reino poderoso, tornou-se apenas cinzas e destroços. As pessoas que sobreviveram aos anos negros, conseguiram erguer comunidades que mantiveram por pouco tempo a esperança acesa e como toda a degradação que nos é imposta por simplesmente sermos humanos...começou, estamos vivendo a era da fome, como relatam os sábios mais velhos e estamos sobrevivendo com o que encontramos do antigo reinado. 

             Alguns homens como eu próprio, vagueiam pelas terras desoladas em busca de uma luz salvadora, mas nunca a encontramos e...isso não me fez perder a fé. Nossos nomes são retirados assim quando nascemos, os anciãos contam que as crianças maculadas não deviam viver nas pequenas sociedades ainda existentes, pois nossa doença com certeza as fariam sucumbir e é por isso que estou aqui buscando uma luz, algo que: retire a febre que toma conta do meu corpo durante a manhã, limpe o sangue de meus olhos que escorrem durante a tarde e por fim que arranque a podridão da minha carne.

            Foi logo pela manhã, após ter visões em meus sonhos de um futuro onde eu poderia ver a "luz" do mundo que eu comecei a viajar o mais rápido possível. Eu podia sentir o sol bater na pele do meu rosto e por isso o escondi com meu capuz enegrecido devido ao tempo, o vento não acompanhava o sol...Era gélido e fazia tremer e foi por isso que joguei as longas capas puídas por cima de meu corpo. Então pude partir para norte, eu simplesmente adentrava um pequeno bosque com árvores de cada lado da trilha estreita que ia parque a dentro e, eu não sabia como estava ali, só sabia que devia seguir em frente...Não demorando mais de uma hora e meia de caminhada pude ver surgir o longo horizonte sem arvoredos, uma placa de carvalho bem preza ao chão dizia a qualquer viajante. "Afaste-se de Dawenwood" e "Obrigado pela visita e não volte sempre", isso era comum nos últimos tempos, os pequenos lugarejos não possuem muita comida e por isso afastam o máximo de pessoas possível eu, infelizmente tive de ir adiante, precisava de um lugar melhor do que o chão para descansar e um travesseiro melhor do que uma pedra para me confortar... E foi andando até este lugarejo no horizonte que pude ver:paliçadas mal armadas, cabanas mal feitas de pedregulho rachando e madeira apodrecendo, uma ferraria caindo aos pedaços, uma mansão sombria e abandonada e por fim uma taberna cuja o bardo local tocava uma melodia triste e extremamente alta com um alaur desafinado.

            Eu sem maldades segui a melodia e já esperava que me olhassem estranho, afinal eu portava a mácula, a doença e a escrotidão de ser quem afetava de forma negativa as pessoas, mas já não me importava com estes abusos desde de os dez anos de idade e, assim adentrei o local, a porta enferrujada rangia chamando a atenção e como o esperado eu fui olhado com malicia de maus intencionados, minha presença causava discórdia menos ao taberneiro que sorria e me dizia com uma voz pesada e roca graças a idade avançada.

  -O que trás um jovem sem nome Dawenwood?-Nesse momento ele limpava um caneco rústico de madeira e o jogava sobre o balcão e eu ficava espantado achando ser algum golpe súbito.

-Nada senhor...Estou apenas de passagem.-Respondi-o rapidamente, a mesma e velha resposta que sempre trouxemos na ponta de nossas línguas.

-Não seja tímido meu rapaz, eles são mau encarados mas metade desses homens teriam a coragem de fazer alguma coisa e muito menos da metade dessa metade de fato faria algo.-Ele retrucou e gargalhou convidando-me a sentar e puxando abruptamente uma garrafa de hidromel e a despejando dentro do caneco.-Não se preocupe, pela falta de cortesia fica por conta da casa.-Ele era um homem gentil, de fato poucos aceitaram com facilidade a presença de um andarilho sem nome. E foi lá onde sentei e pude avistar a mais bela visão cortada apenas pelas grades da janela da taberna, no topo de uma densa colina estrepada eu pude ver uma bela mulher que rezava ao sol que se punha ao horizonte e levava consigo todo o calor que restava, deixando apenas a noite gélida.-Aquela meu jovem, é uma sacerdotisa tocada pela lua...Muitos daqui pensam que as mulheres tocadas pela lua são a luz desse mundo...Se essa lenda for verdade...Nós temos sorte de termos uma bem aqui, por isso mantemos todos afastados, ela é a única coisa que devemos defender...-Um brilho encheu meu olhar, será que era aquilo que procurava? Eu me perguntava mentalmente.-Você tem um quarto?-Puxei vinte vinténs e larguei-os sobre a mesa o homem sorriu e balançou a cabeça positivamente. 

                Ele me levou mais para dentro do estabelecimento e me mostrou um quarto não muito bom, apenas haviam alguns ratos ele acendeu uma vela e repousou sobre uma mesa então saiu do quarto. Foi neste momento em que coloquei o caneco que carregava comigo em cima da mesa e puxava de dentro da mochila o livro e a pena conjunto com o tinteiro. O vento gelado entrou no quarto e fez a portilha da janela balançar e bater e foi então que comecei a escrever esta página.

Sangue e FerrugemWhere stories live. Discover now