- Mãe, eu vou ficar... – Antes de terminar ela corta-me. – Trouxe pastéis de bacalhau, os teus preferidos. Lembras quando vocês roubavam todos e escondiam-se na vossa tenda mágica.

Sorri pra ela, não tem jeito, ela consegue inverter o jogo. Daria uma boa negociadora! Mas aquilo me fez recuar no tempo, sem dar pelos passos dos meus pensamentos, já estava dentro do passado: - Sim, mãe, lembro-me! – Disse sorrindo por dentro.

Yara achava que os monstros estão fora dos lençóis, bastava estar debaixo dele comigo para sentir-se protegida.

- Ela sempre gostava de brincar assim contigo. – Lembrei-me quando ela me insistia para brincar assim, até mesmo na presença dos meus amigos. – Ela pediu tanto para rumar para Suíça quando partiste! – Disse a minha mãe.

Espera, eu nunca soube que ela foi por minha causa. – O teu pai tentou fazer a brincadeira várias vezes enquanto ela crescia, mas nunca teve sucesso. Parece que não era o lençol, mas sim você.

As palavras dela ofereceram-me um novo flashback:

Depois dela jogar-se no meu corpo a soluçar. Tentava acalma-lá de todas as formas, mas não tive sucesso.

- vem comigo para cama. – Sugeri, mas ela recusou a minha ideia.

- Nunca mais me vou deitar nessa cama. – Foi quando notei que as suas lágrimas eram de raiva.

Lembrei da nossa antiga brincadeira. – Vamos nos cobrir com os lençóis, ele vai nos proteger.

- Não, - Ela disse e apertou-me forte. Como da última vez em que ela ainda estava viva. – Já sou crescida, já não tenho oito anos, sei que não é o lençol, o meu protetor sempre foste tu.

Suspirei e a abracei forte.

- Então conta-me, o que aconteceu?

- Minha mãe acordou-me daquele retrocesso com um aperto nas minhas bochechas. – Diabos, mãe! Já não sou uma criança.

- Vais ser sempre pra mim. – Ela disse aquelas palavras típicas de uma mãe.

"O que passa na cabeça de uma mãe?"

- O teu segredo está bem guardado! – Disse e me deu alguns sacos.

Em seguida o Miguel entrou com alguns sacos também e uma maçã. – Calma, tu sabias disso traidor? – Questionei baixinho e ele fez uma carinha de inocente.

- Eu o convenci, ele é inocente. Agora arrumam as coisas.

Não acredito que a minha mãe vai me obrigar a arrumar as compras, alguém diz a essa senhora que estou em minha casa? Como se isso funciona-se.

- Já agora, qual segredo?

- Esse teu perfeito coração que escondes do mundo.

"Isso se ainda tenho um coração"

Talvez é mas fácil partir do que ficar. Quem fica pode até suportar, esquecer a dor. Ou no meu caso, estar completamente bem fisicamente, sem nenhuma cicatriz para lembrar, excepto a saudades, ainda não há lápis a cor para pintar o espaço sem cor que há no meu coração.

Dois estranhos que terminam em 69Onde as histórias ganham vida. Descobre agora