Eu nunca tinha amado.
É claro que não estou falando de amor por mãe, pai ou irmãos. Esse tipo de sentimento parece que já nasce com a gente, e mesmo que várias vezes passemos muita raiva, o lance amoroso familiar é um troço arraigado no nosso coração, e que nos faz nutrir boas vibrações nas linhas parentais. Tá certo que na adolescência muitas vezes eu tenha acreditado piamente que poderia odiar a minha mãe por ela não ter me deixado ir a uma festa, ou uma vontade muito grande de assassinar o meu irmão tenha surgido no meu peito depois de uma discussão acirrada sobre quem ficava com o controle remoto da televisão, mas nada que me fizesse deixar de amar a minha família.
Estou falando aqui do amor romântico. Aquele que a gente nutre por outra pessoa, e tem vontade de fazer sexo com ela, assistir filmes juntos e passear de mãos dadas no shopping.
Desse sim eu posso repetir, eu nunca tinha amado.
Conheci o amor mais tarde que a maioria das pessoas. Na adolescência, acho que eu sofria dessas coisas de não querer amadurecer. Enquanto todas as minhas amigas já trocavam perdigotos e iam para boates, eu ficava em casa brincando de Barbie. E isso durou até tarde. (Por favor, não me julgue, mas eu tenho a minha coleção de bonecas até hoje. Aliás, foi a primeira coisa que eu guardei na estante da casa dos meus pais — por motivos óbvios de não poder levar isso para a minha residência de adulta —, com um bilhete enorme colado na frente que era proibido, até o final da eternidade, permitir que qualquer criança tivesse acesso às minhas filhas de plástico.)
Sendo assim, eu não me interessava por ninguém, nem do sexo oposto nem do mesmo sexo. Simplesmente não estava interessada em nada que pudesse parecer um relacionamento amoroso. Acho que meus pensamentos eram muito infantis e isso não pode ser considerado uma coisa totalmente ruim. Eu apenas era diferente.
Na faculdade me interessei muito pelos livros de romances eróticos. Mas foi muito mesmo! E então eu comecei a achar que tinha alguma coisa errada comigo por nunca ter tido um namorado nem nada vagamente parecido com isso. Vivi uma paixão louca pelo Cristhian Grey, do 50 tons de cinza. E francamente achei que ninguém no mundo pudesse ser capaz de suprir aquele amor todo que eu tinha por ele. Assim, minha vida amorosa só foi mais atrasada, já que eu não conseguia achar nenhum CEO rico por aí, que possuísse um helicóptero, se apaixonasse por mim, e me desse presentes a torto e a direito, além de comprar uma empresa só para ser o meu chefe. A parte de apanhar eu dispensava.
Eu bem que procurei um sujeito assim mas não obtive sucesso. Ou não. Tá, a verdade é que eu só procurei nos livros mesmo, porque na vida real eu era uma bocó. A timidez sempre me acompanhava e eu não era uma pessoa que pudesse se chamar de muito bem relacionada. O meu visual me incomodava muito, eu me achava a pior das garotas, com meu aparelho nos dentes, os fundos óculos para miopia e a falta de seios que me fazia usar roupas com zero de decote. Eu nem era capaz de me interessar por ninguém, e acho que era por puro medo de levar um fora.
A primeira faculdade que entrei foi Letras. Fiz apenas dois semestres e odiei. Eu achava que ia passar o dia todo lendo e debatendo livros, mas a realidade é que ficava estudando tipos de oração e morfologia das palavras. Um saco! E as poucas aulas de literatura que eu tinha, as pessoas falavam que aquilo que eu lia era lixo. Quanto maior a capacidade de divertir o leitor, mais os meus professores odiavam. Chegaram a dizer que os livros da Silvia Day deveriam ir para no fundo de uma lata de lixo! Era demais para mim! Estavam falando na minha cara dos grandes amores da minha vida!
Pelo visto o texto tinha que ser sempre de impossível compreensão para que alguém ali no mundo acadêmico pudesse gostar dele. Cambada de gente chata!
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Um doce de confeiteiro - DEGUSTAÇÃO
ChickLitUma jornalista obstinada, em busca de novos horizontes na carreira. Um confeiteiro premiado, que prefere a reclusão de sua cozinha. Renata acreditava que aquele seria seu último dia de trabalho na redação atual e então ela poderia seguir para o empr...