A Elfa Maga

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Eu não queria acreditar no quanto havia me enganado. Mas havia. Agora estava à mercê da criatura e totalmente ensanguentada e ferida, sem ter como salvar aquele que confiou em mim. Eu deveria ter seguido meu coração desta vez.

A razão só fez estragar as coisas.

Alguns dias antes...

Já colhi a lenha. Já varri a casa, já limpei o jardim, plantei as ervas, tirei as daninhas, esquentei a água. Eu não deveria fazer isso. Sou a aprendiz, não a empregada da casa. Mas quem sou eu pra reclamar?

Na verdade, acho que posso reclamar sim. E muito. Antes eu era a elfa Ferry. Agora sou a doméstica Ferry. Não que eu tenha algum problema com isso, certo, mas não foi pra isso que eu vim.

Sempre admirei os magos. Sempre admirei aqueles homens que passavam pela minha aldeia oferecendo curas e fazendo encantamentos, por que não? Eu também queria ser útil. O que tem demais em eu ser uma elfa? Ou o que teria demais em ser uma mulher elfa?

Para minha aldeia tinha. Certo, eu não era a mais útil das pessoas, especialmente por não saber lá cozinhar muito bem, mas ao menos eu não quebrava coisas TODOS os dias. E nem sempre eram tão importantes assim. Eu sempre dizia que seria uma grande elfa maga. Os aldeões me respondiam dizendo que eu já era uma elfa muito magra.

Idiotas.

Quando aquele mago em especial passou pela aldeia, eu me sentia preparada. Ele fez alguns encantamentos simples, curou algumas pessoas, mas não impressionou os outros elfos. Não fazia muito alarde e suas curas não tinham nada de espetacular como as outras, não havia explosões ou cores. Talvez ele fosse diferente. Talvez não fosse me escorraçar como os outros ou me destratar como fizeram.

Quando pedi, na frente de toda a aldeia, para que eu pudesse ser sua aprendiz, todos ficaram de ouvidos atentos para a próxima humilhação pública. Eu já virara piada nos bares. Todos os magos até então tiraram sarro de mim ou me trataram feito cachorro, me enxotando como se eu não fosse nada demais.

Entretanto, após alguns minutos em silêncio, pude ouvir as palavras que há tanto tempo esperava:

– Ah, tá. Ok. Tanto faz.

Certo, não eram exatamente as palavras que eu esperava, mas ele também não parecia grande coisa. Corri para minha cabana, juntei minhas coisas, me despedi de todos rapidamente antes que pudessem me impedir. Na verdade, parecia que estavam felizes ao me ver partir. Ou então não acreditavam muito que eu iria conseguir, dada as risadinhas espaçadas.

Mas eu conseguiria. Voltaria como uma grande maga ou não voltaria.

Bem, provavelmente voltaria, não tinha lá muitos outros lugares para uma elfa morar.

O mago era humano. Ele não se incomodou de eu ser de outra raça ou, se importou, não pareceu ligar muito. Mas ele não era tão misterioso como eu pensei que fosse. Na verdade falava como se o mundo fosse acabar amanhã.

– Então teve aquela outra vila...Qual era o nome dela mesmo? Ah, não importa, o fato é que fiquei com eles dois meses e aí o filho do chefe ficou doente. Claro que me chamaram inevitavelmente e rapidamente o curei. Não pude contar a eles que o filho do chefe havia comido uma das minhas ervas antes de ficar doente. Ninguém precisa saber como opero minhas curas.

Revirei os olhos. E se, ao invés de mago, ele fosse só um curandeiro? Eu vou saber voltar para casa?

Sorri quando ele me fez uma pergunta. Normalmente eu não precisava responder; ele mesmo fazia isso.

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