Capítulo 19 - I won't give up

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Dentre todos os possíveis futuros imagináveis para o meu pretenso final de ano tranquilo, aproveitando meus restantes dias de férias em Nova Iorque, posso afirmar que não havia pensado que estaria mais uma vez em uma fila de embarque no aeroporto JFK, carregando minha mala com rodinhas, tentando disfarçar meu claro tremor interno de ansiedade e pavor por estar a poucas horas de voltar para casa.

Refazia mentalmente minha lista de itens que tinha conseguido enfiar dentro da bolsa, o que incluía pasta de dente, uma troca de meias, analgésicos, "Obra completa e Dramas para Palco – Peças de William Shakespeare" e uma boa quantidade de barras de chocolate e chiclete que Samantha e Jenny fizeram questão de que eu levasse comigo. "Vai te ajudar a passar algum tempo distraída com alguma coisa melhor do que o resto da sua vida", Sam disse. Muito sábia e animadora.

Estava entregando a passagem nas mãos do atendente do guichê quando me lembrei da primeira vez que fiz uma viagem de avião. Tinha por volta de quatorze anos e recordava exatamente como estava vestida com uma pesada camada de blusas para fugir do inverno de Nova Orleans, partindo com destino a Houston, onde minha avó materna costumava residir antes de se casar pela quarta vez. Claramente a vida amorosa do meu lado materno da família era bem mais agitada do que dos Dalton.

Naquele ano o inverno estava particularmente mais intenso naquele lado do país, o que queria dizer que estava um pouco mais parecido com as outras regiões, já que no sul o inverno nunca seria tão rígido. Mas para todas as pessoas da minha cidade significava que aquele seria um final de ano maravilhoso, provavelmente com a sorte de termos temperaturas baixas, casas bem decoradas e uma ótima desculpa para colocar um pouco mais de pimenta no jambalaya.

Obviamente, minha mãe discordava da felicidade invernal de todo o resto dos pobres mortais e nos levou diretamente para o Texas, para fugir do clima natalino e com o bônus de fugir também do meu pai e todas suas tentativas fracassadas de reunir as filhas para a festa de Natal. Ela nunca permitiu que ele tivesse alguma sorte em estar com a gente em mais do que poucos finais de ano, mesmo quando podíamos simplesmente escolher estar com ele.

Não me lembro exatamente como foi aquele natal na casa da minha avó porque provavelmente foi mais uma daquelas reuniões da família materna em que todos ficavam elogiando e rodeando Adria enquanto eu me divertia com alguma coisa menos entusiástica, como livros. E realmente não me arrependo de ter perdido estas memórias no limbo cerebral das "coisas ridículas pelas quais já passei na vida".

Encontrei meu assento dentro do avião e senti um breve alívio em notar minhas pernas um tanto quanto incômodas no banco do setor econômico. Ainda não havia descoberto o motivo de ter conseguido voar na primeira classe na viagem para Londres, mas ter meus joelhos apertados pelas costas do senhor no assento da frente servia de lembrança de que minha vida tinha voltado para aquele caminho sinuoso e obscuro de sempre.

Sim, eu estava em uma onda de pessimismo. Não, eu não estava inflada com a coragem dos meus atos futuros ou me alimentando de esperanças. Sempre fui muito realista com algumas coisas e encontrar minha avó paterna sempre foi motivo de pensar nas coisas ruins do mundo, quase um tipo de antídoto para o pozinho mágico das fadas que supostamente deveriam fazer você pensar em coisas boas para voar. Se uma fada usasse pó mágico na minha avó, com certeza haveria um lapso no rumo do destino universal, que abriria um portal espaço tempo e sugaria toda a realidade que conhecemos para um obscuro mundo paralelo sem rumo. Ou a fada morreria, o que é bem mais provável.

Foi pensando em fendas temporais e acontecimentos mundanos que me recordei do jantar da noite anterior, logo que cheguei do hospital e minha visita a Sra. Fighbright.

Assisti a mãe de Samantha me encarar por alguns segundos antes de conseguir levar um pedaço de almôndega com molho até a boca. Ela parecia bem incrédula quanto a minha tendência de atrair coisas humanamente impossíveis de ocorrer, ainda mais depois de toda a minha descrição sobre o que minha antiga vizinha havia me revelado.

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