Capítulo 10 - VIAJANTES

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VIAJANTES

Findava a tarde quando o casal de meia idade se despediu dos pais já idosos. Puseram os dois no carro de aluguel e guardaram as malas na parte de trás da carruagem. Observaram-nos acomodar nos bancos de madeira lustrosa. Durante todo tempo não deixaram de falar, recomendando cuidado, atenção, juízo e que se divertissem. Assim que o carro saiu levando o casal, os filhos se entreolharam, deram de ombros, como se não tivessem mais o que fazer. Dever cumprido. E seguiram cada qual para um lado.

Saindo da cidade, sorriram um para o outro sentindo e mostrando a grande felicidade que estavam sentindo. Cinquenta anos de casados. Bodas de Ouro! E o presente dos filhos: Uma semana na estalagem mais cobiçada do povoado.

Iam deixando com prazer a vila em que viviam há tanto tempo para desfrutarem de um passeio romântico, saborearem alimentos diferentes e terem, enfim, as merecidas férias. Rodaram em silêncio por alguns quilômetros, apenas ouvindo os cascos dos cavalos no cascalho, mas assim que deixaram a estrada principal para entrar numa estrada secundária, ele começou a falar do seu passado, relembrando a infância e adolescência vividas no campo. Ela, que sempre vivera em vilas com mais pessoas, ouvia fingindo atenção até que começou a cochilar.

Despertou com um ruído estranho. A estrada, agora que começara a escurecer, estava deserta. Árvores velhas com troncos retorcidos farfalhavam na noite escura. Um vento tímido agitava os galhos e folhas leves caíam pelo chão. Acarruagem parou. O marido olhou para a esposa e ela o sentiu preocupado. Desceram, apesar de indecisos. Que poderia ter acontecido? Os filhos haviam alugado o carro e os cavalos e, com certeza, haviam se certificado que tudo estava em ordem. Nada poderia estar errado. Mas estava. E logo ali, naquele lugar estranho, no início da noite...

Desceram e concluíram que uma das rodas havia se soltado. Não tinham como consertar, ali, sozinhos. Estariam distantes da estalagem? Tentando parecer calmo, ele pegou uma lanterna e olhou o mapa, (era bom em geografia). Pareciam não estar longe. "Querida, vamos caminhar um pouco. Talvez encontremos uma ajuda para nos orientar". Prenderam os cavalos da melhor forma possível. Voltariam logo para buscá-los. Tomaram um desvio (tinham medo de ficar na estrada mais movimentada). E deu certo. Meia hora depois avistaram uma casa. E apesar de ser muito simples estava toda iluminada e esse fato os encheu de ânimo. Pinheiros escuros que a circundavam davam-lhe um aspecto de sombria àquela hora da noite, ainda assim, se aproximaram.

Nenhum cão denunciou a presença deles. Bateram forte na porta que não demorou para ser aberta. Na soleira, uma mulher jovem e bonita olhou surpresa para eles. "Que dois idosos faziam àquela hora na sua porta?"

Explicaram. Meio reticente, foram convidados a entrar. "Podiam ficar enquanto pensavam no que fazer?"

A dona da casa recolheu-os e apesar de parecer um pouco insegura, preparou um chá para o casal que se mostrava agora muito aflito. "Não se preocupem, acho que terão que pernoitar aqui. Parece que um temporal está caindo pelas redondezas. E ainda bem que vocês encontraram minha casa, não vai tardar a chover aqui também".

Mal a moça falou, uma lufada de vento ergueu as cortinas que forravam toda sala.

Rapidamente a dona da casa as puxou, acomodando-as no lugar, sem dar tempo à Joana e Mário de verem os tijolinhos de chocolate presos à argamassa de suspiro que sustentava toda a parede.

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