19. BANANA - PARTE I

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Já havia revirado a casa toda atrás da minha blusa, e começava a me atrasar para ir para a patisserie. Eu sabia que o dia ia esfriar e me recusava a sair sem o casaco que eu queria.

Sentei na minha cama para pensar um pouco quando me veio a imagem do casaco sobre a cama de Cristofer. Eu havia deixado ela lá na noite anterior quando busquei os livros em seu quarto.

Fiquei parada algum tempo pensando que eu poderia muito bem escolher outro casaco e seguir meu dia, ir trabalhar sem maiores complicações, mas não foi o que fiz. Sabia que ele deveria estar cansado da noite no hospital, mas não me importei com nada, e quando dei por mim já estava em frente a sua porta.

Bati algumas vezes e nada. Pensei que ele pudesse estar num sono muito pesado, então passou de relance em minha cabeça desistir de incomodá-lo, mas não. Não voltei para casa. Fitei a maçaneta por um instante, toquei-a de leve e a virei para abrir. Minha expressão foi de espanto quando a porta se abriu. Fiquei me perguntando se deveria continuar. Mais uma vez, quando dei por mim, já estava no meio da sala, que agora parecia de uma casa realmente habitada.

Fui para o quarto dele em silêncio e coloquei apenas minha cabeça para dentro. A bagunça continuava lá, mas algumas coisas estavam mexidas. Ele não estava. Concluí que ele não deveria ter voltado para casa ainda. Era uma pena que eu não fosse vê-lo. Precisava aprender a me acostumar com a vida de médico dele.

De longe avistei minha blusa sobre a cadeira misturada com algumas camisas dele. Não era difícil ver minha blusa amarela em meio a suas roupas de cores neutras. Apanhei minha blusa e já estava saindo do quarto quando notei a porta do armário com uma frestinha aberta. Forcei para fechar, mas a quantidade de coisas lá dentro parecia maior do que o espaço era capaz de suportar. Forcei algumas vezes inutilmente até que resolvi abrir a porta para ver o que estava impedindo que a porta fechasse.

Quando abri, uma caixa pesada caiu sobre mim espalhando parte do que ela continha no chão. Não era como as caixas de mudança que estavam espalhadas por toda a casa, esta era diferente, assim como seu conteúdo. Era uma caixa azul com a tampa florida.

A coloquei sobre a cama e tratei de recolher o que tinha ficado no chão. Coloquei tudo rapidamente para dentro e fechei. Parei com as duas mãos sobre a tampa, eu não deveria mexer no que não era meu.

Fechei meus olhos e respirei fundo para tentar mudar os pensamentos que invadiram minha mente, mais uma vez não pude me controlar. Então, abri a caixa novamente bem lentamente.

Era muito errado mexer ali, mas meus dedos que estavam trêmulos se moveram como um imã para dentro da caixa.

Olhei para a porta  antes de continuar a xeretar, para ter certeza de que estava sozinha no quarto de Cristofer. Em seguida, mirei a caixa com o maior cuidado e perícia que pode. Consegui ver alguns anéis e também uma correntinha com um pingente em forma da letra "a" além de muitos envelopes, não abri nenhum. Sob eles encontrei uma caixinha de jóia que segurei com uma das mãos temendo seu conteúdo.

Parei por alguns instantes enquanto segurava a caixinha de jóia na mão. Olhei lá para fora pela janela, respirei fundo e fechei os olhos. Não devia estar fazendo aquilo, meu cérebro me censurava a todo instante, devia ter me controlado, mas não pude, uma força sobrenatural me empurrava e eu não conseguia controlar. 

De olhos fechados, pude sentir o toque de veludo da caixa. Passei os dedos da outra mão no veludo e me arrepiei com o som que fez e então a abri. Depois de puxar o ar para os pulmões com força, abri também os meus olhos. Então tive a confirmação. Era um anel de noivado, lindo.

Soltei o ar todo que tinha inspirado violentamente pelo meu nariz e por minha boca, era como se o ar tivesse sido sugado do meu peito. Não removi a aliança da caixa, mas a aproximei dos meus olhos para ver melhor. Era brilhante e dourada, tinha uma pedra delicada, não era grande. Balancei a cabeça negativamente e fechei a caixinha um pouco chateada.

Eu deveria ter me dado por vencida, mas não parei. Deixei de lado a aliança quando encontrei um bolinho de fotos que estava amarrado por uma fita.

A primeira foto era linda, assim como a pessoa que estava nela. Uma moça que aparentava ter a minha idade. De cabelos loiros ondulados, em uma praia qualquer, ela sorria com uma flor amarela nos cabelos.

Não conseguia parar de olhar a imagem. Seu sorriso se irradiava na foto que tinha como cenário o céu azul de algum final de semana, provavelmente.

Inconformada e um pouco enciumada não pude deixar de olhar atrás da foto para ver se havia escrito o local que a foto havia sido tirada. No entanto, havia apenas um nome escrito.

A caligrafia mais uma vez era horrível, deveria ser a mesma pessoa que havia feito a dedicatória no livro de Cristofer. Precisei aproximar a foto dos olhos para ler.

Cerrei meu meus olhos, com a foto quase tocando meu nariz, e finalmente entendi. Amanda era o primeiro nome. Precisei um pouco de esforço para entender o sobrenome. Li umas duas vezes mentalmente quando finalmente entendi as letras tortas e borradas. Meu cérebro travou por um segundo e eu li mais uma vez o sobrenome agora em voz alta.

Quando finalmente decifrei o restante do nome meu espanto foi tão forte que levei minha mão sobre a boca com tanta força que chegou a doer como se eu tivesse me dado um tapa. Senti meu coração acelerar e doer. Não estava respirando direito e minha pressão despencou, comecei a tremer instantaneamente. Joguei a foto na caixa assustada e coloquei tudo lá dentro novamente às pressas. Estava confusa, e morrendo de medo de, além de tudo, ser flagrada por Cristofer.

Coloquei a caixa dentro do armário de qualquer jeito e sai correndo da casa de Cristofer. Desci as escadas rapidamente também, o mundo parecia estar se movendo rápido demais sob meus pés que andavam acelerados. Só desacelerei quando já estava a uma quadra de distância de casa e com falta de ar. Parei no meio da rua que indicava várias direções, mas o momento para mim parecia não oferecer nenhuma saída.

Um senhor chegou a me oferecer ajuda e perguntar se eu estava bem. A expressão no meu rosto com certeza estava assustadora. Se ela refletia o que eu sentia, estava horrível.

Comecei a caminhar lentamente pela calçada com a respiração ainda acelerada. Vez ou outra eu levava minha mão à boca novamente até que, pela ultima vez, quando minha mão estava espalmada sobre a boca, foi deslizando lentamente pelo pescoço até que eu sentisse minha cicatriz, e ali minha mão repousou. Senti meu coração querer rasgar a marca de tão forte que batia.

O Novo InquilinoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora