R evolução

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(VISÃO DO LUCCA)

Vejo minha mãe abraçada a Serena. Com Julia tinha sido diferente, ela mal olhava na cara da minha namorada, levou algum tempo para que ela aceitasse. Depois desse tempo não havia mais Julia. Não sei o que estou fazendo, minto para a minha mãe dizendo que Serena é minha namorada, minto pra mim mesmo dizendo que não gostaria que isso fosse verdade. A realidade é que me desdobro com os sentimentos enquanto tento decifrar o que a vida de S é. Talvez mal ela saiba. 

Minha mãe se despede novamente e sai pela porta da frente, ela se orgulha em saber que reconstruí minha vida. Não posso negar, depois de inúmeras festas e mulheres da qual eu tentava trazer a vida de Julia, eu comecei a caminhar. Comecei a tentar viver depois do dia em que acompanhei uma moça ao supermercado. Eu não aguentava mais olhar para os rostos felizes das pessoas naquele apartamento do Vista Cay, eu precisava tomar um ar, comprar cerveja foi a melhor desculpa inventada, mesmo que já tivesse dezenas de latas fechadas na geladeira de Leo. Foi quando vi Serena fechando sua porta. Seu rosto me remetia alguém. Seu rosto era o espelho do meu. Nós dois nos sentíamos fracassados. 

Agora percebo que encaro o chão, a luz se apaga. É confortável observar um ponto específico, sem que ele próprio te julgue, ou se mude. Não posso querer Serena só para mim, seria péssimo. Não quero ser outro trauma em sua vida. Mas será que ela tem noção do quanto me ajudou? Eu não sou Philip, eu não a salvei do dia mais importante de sua vida, sem mim ela ainda estaria viva. Mas eu posso ter algo que Philip não tem. Ouço um som distante. "O que é?" a voz desconfiada de Serena me pega de surpresa, mas não há reação vinda de mim. Não consigo fazer o que quero fazer nesse exato momento. "Aconteceu alguma coisa?" ela pergunta novamente, preocupada. "Eu to com raiva" seria raiva mesmo que sinto? ou vergonha? Quero dar um passo a frente e derrubar essa casa com meu coração. Mas meus pés não se movem.

"Raiva? Raiva de quê?" "de mim" é raiva de mim Serena, por não conseguir fazer o que quero "E por que, Lucca?" "Eu sou egoísta demais" e é verdade, quero puxa para mim e fazê-la feliz. Me sinto egoísta por ficar feliz com a possibilidade de ser o único homem da qual possa ser verdadeiramente sincero com ela, eu me sinto egoísta por ficar feliz por não ter dado certo com Philip. Mas ela parece não querer entender o que quero dizer.

A luz está apagada e sua mão vai de encontro a minha, eu seria capaz de acender uma cidade inteira apenas com a luz que seu calor trás em meu peito. Escuto sua boca abir para perguntar novamente o que tento dizer "Luc.." ela sibila. Não deixarei ela escapar, não como fiz com Julia. Digo á ela. 

Digo á ela tudo que quero dizer. 

O quanto de frases anotei em meus livros de medicina, sem prestar atenção a nada do que o velho professor a minha frente dizia. Eu desabo e desabafo como se eu estivesse falando com um ser humano aleatório sobre a possível mulher da minha vida. Tento me mostrar pra ela, tento faze-la me ver. Eu sou intenso demais, não consigo amar pela metade, ou demonstrar de menos. Eu sou o que a vida me fez, e tudo isso é o que tenho á mostrar para Serena. Ela me entende, como pensei que entenderia. "As vezes as palavras nos traem Lucca, não precisava falar" eu entendo o que ela diz, e fico feliz. Dois corações quebrados podem se remendar, podem se completar. 

E eu faço o que venho sonhando em fazer. Minha imaginação me trai, em nenhum dos meus pensamentos eu poderia ter tido uma miragem de como seu doce calor é. Seu beijo é calmo, e eu não preciso me preocupar em seguir seu ritmo, nós nos encaixamos. Eu gosto de cantar, de estudar as melodias, e eu não reclamaria de passar o dia inteiro estudando a bela canção que é eu e Serena juntos. 

Lembro do toque de Julia, e o quanto eu gostava dele. Não sou mais aquele Lucca. Não mais. O que passei para chegar aqui, e os meus restos que estão no chão, foi o que eu ofereci a Serena. E foi o que ela aceitou. Não sou perfeito como Philip, não tenho olhos verdes e não sou digno de vitrine. Mas a vida é feita das intenções que temos. Minha intenção no momento é ajudar Serena se recompor.  Não eu propriamente refaze-la e catar os cacos do chão, preciso estar ao lado dela, isso é o necessário. E é exatamente o que acontece agora. Os dois dão uma chance a vida novamente, logo após os traumas já passados. Talvez não dê certo, mas nenhum conto de fadas foi iniciado com um "talvez". 

"Obrigada por compartilhar esse momento comigo" digo, já sabendo que a evolução que ocorre em mim, também ocorre nela, "que momento?" Serena pergunta, ela não é boa em esconder as emoções também, "sua vida" respondo, sem precisar entrar em detalhe algum. E então percebo, com seu sorriso entreaberto, naquela enorme sala que acabara de se fazer pequena com tamanha explosão de felicidade. Percebo que ela também sabe que algo ali mudou.



FinalmenteWhere stories live. Discover now