— Você acordou, voltou para a vida — ele sorriu, novamente de forma ampla. — Por enquanto você vai ter dificuldades para se movimentar, mas será por pouco tempo, pois seus músculos estão bem. Você recebeu tratamento fisioterápico e rejuvenescedor intenso e de alta tecnologia enquanto esteve em coma. Aparentemente é seu cérebro que ainda não se acostumou a estar acordado. Fique tranquilo, você receberá toda a atenção necessária e vai melhorar.

As palavras do doutor me passaram confiança, mas só pude dar um sorriso tímido que fechou nossa reunião.

No meu quarto, recebi a visita da moça que vi ao acordar do coma.

— Com licença, senhor!

— Toda.

A moça aproximou-se da cama flutuante e ficou me observando sorridente, tinha os olhos úmidos. Cumprimentou-me.

— Está se sentindo melhor?

— Acho que melhor que antes — sorri com o canto da boca.

— Pelo jeito o senso de humor já está se normalizando.

— Não tenho ideia de como era meu senso de humor.

— Me desculpe! — respondeu com o semblante sério.

— Que isso! Não quis te constranger — falei com a voz trêmula.

— Senhor! Sou sua fisioterapeuta, meu nome é Julia. Estou cuidando de você há cinco anos — respirou fundo. — Preciso fazer um breve exame de rotina para darmos prosseguimento ao seu tratamento.

— Prazer, Julia. Que tipo de exame?

— Um teste elétrico associado à nanotecnologia e chips que implantamos em você. Terei um diagnóstico completo de sua condição física.

— E como vamos fazer isso?

— Feche os olhos e relaxe, vai doer um pouco, mas vai ser rápido.

— Ok.

Fechei os olhos. Julia levantou minhas pernas e inseriu a agulha de um aparelho na sola dos meus pés. Meu corpo tremulou e senti os músculos enrijecerem. Foi doloroso, mas prazeroso. O tratamento durou uns cinco minutos e vários gemidos. Quando acabou e meu corpo se acalmou ela me mostrou um gráfico holográfico com meu porcentual de massa magra e gordura, além de verificações sobre os ligamentos, ossos e circulação sanguínea.

— Pronto, acabou.

— Uau! Esse é o meu corpo? — falei olhando o holograma que flutuava no quarto.

— Sim, esse é você.

— Impressionante! Mas você disse que ia doer só um pouco — sorri.

— A dor é coisa da sua cabeça.

— Minha cabeça não se lembra de ter sentido uma dor tão intensa antes. Na verdade não me lembro de quase nada. Tudo é tão estranho. Como os hospitais podem estar tão evoluídos? Só me recordo de lotações e tragédias na saúde.

— Sua memória vai melhorar. Não se preocupe.

— Moça, me explique. Como posso estar em 2333? Tenho uma vaga lembrança que sou de 1990, ou algo assim? Sabe, não consigo ter certeza. Não existe organização de tempo na minha mente. Não lembro sequer do rosto de minha mãe, ou se tive filhos, meu nome, não lembro meu nome. Nada — o desespero ficou nítido em minha expressão.

Vi tristeza no rosto da mulher. Senti um vínculo. Empatia.

— Senhor, acalme-se. Foram vinte anos adormecido. Sua mente está confusa. A psicóloga virá conversar com você, sabemos que não há tecnologia que supere compartilhar nossos sentimentos com outro humano. E aqui no Tavares de Souza somos especialistas nisso. Infelizmente não temos registros do senhor, nem mesmo nas redes chipnanosociais, não foi possível traçar um perfil psicológico, nada. O senhor é um mistério. Assim que tivermos um diagnóstico preciso, teremos como te deixar como em um paraíso. Aguente firme, você irá se lembrar da sua vida.

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