Falling

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"Você está bêbado" Digo com um sorriso, tirando a garrafa quase vazia de vodka da mão de Todd. "Você precisa me levar pra casa, lembra? Por favor, não beba demais...".
"Não estou bêbado, amor... Eu estou feliz!" Ele diz com um sorriso malicioso em seu rosto e arranca a garrafa de minhas mãos, terminando de esvazia-la de uma vez só. "Não precisa me avisar, June, eu sei minhas obrigações." Ele revira os olhos e tira seu braço de meus ombros.
A verdade é que eu não queria estar ali, já havia acordado com um mau pressentimento, mas decidi acompanha-lo, apenas para não ter que ouvi-lo gritar comigo mais tarde.
Uma menina de olhos verdes o encara e arqueia uma sobrancelha, ele sorri e se afasta de mim. Ao mesmo tempo em que o faz, meu melhor amigo se aproxima de mim e segura meu braço.
"Não sei o que você ainda está fazendo com esse babaca..." Ele diz, próximo demais da minha orelha, o que faz meu corpo arrepiar com seu hálito de menta. "Você sabe que pode arrumar algo melhor, Jun...".
"Eu já não sei mais..." Olho para baixo, tentando disfarçar como meu corpo havia reagido ao seu toque.
"Ei..." Ele segura meu queixo e me faz olhar para ele, brincalhão como de costume "Te deixei arrepiada?".
Reviro os olhos e mostro-lhe meu dedo do meio.
"Vai se foder, Jake".
"Vou te foder, Jun". Coro e ele ri "Você sabe que estou bêbado, não?" 
"Claro que eu sei, idiota" Dou-lhe um tapinha no ombro e vejo que Todd está voltando. Jake fecha a cara e diz com nojo:
"Um dia eu ainda vou meter porrada no teu cara" Sorrio triste para ele, que cambaleia para a menina mais próxima.
"Vamos, vou te levar pra casa" Todd segura meu braço com força e me arrasta para fora da festa. Noto uma marca vermelha de batom em seu pescoço. A menina dos olhos verdes... 
Sem dizer sequer uma palavra deixo-o me levar para o carro. Ele fedia a cerveja, e estava tão bêbado que mal conseguia enxergar, tanto que errou o carro três vezes, até abrir a porta do carro certo.
Ele me empurra para o banco do passageiro e resmunga algo que não pude entender. O medo percorre minha espinha, mas tento me tranquilizar, pensando que minha casa era perto demais para algo dar errado. Ele pula no banco do motorista e arranca com o carro, numa velocidade bem mais alta do que ele deveria.
"Todd!" Grito, apavorada "Vai mais devagar, por favor!" Agarro-me no banco e fecho os olhos.
"Cale a boca, vagabunda." Ele grita de volta "Por que está gritando? Quer que as árvores e os passarinhos escutem?".
Sinto vontade de chorar e gritar, mas não faço nada. Logo chegaríamos no fim da reserva florestal e eu estaria segura, em casa. Com meu pai e meu irmão... Nada vai dar errado.
"Todd... Por favor..." Sussurro, com minhas mãos tremendo de medo.
Ele freia bruscamente e olha para mim.
"Quer que eu te meta um soco pra  ver se você cala essa boca?" Ele arranca com o carro novamente, enquanto tento segurar as lágrimas e os soluços.
Por que? Por que eu tinha que ter descoberto o segredo dele? Agora estou amarrada a ele, já que, ele ajuda financeiramente meu pai... Não posso me soltar dele e sair viva... Seu segredo é valioso demais para ser "deixado ir embora".
De repente, ouço um barulho muito alto e tudo começa a girar. Pneus cantando, pancadas e xingamentos. Não demora muito para eu sentir o gosto do sangue em minha boca, mas nada vejo, pois aperto os olhos com força.
Antes mesmo de eu poder abrir os olhos, vejo o carro virar lentamente, saindo da estrada e despencando floresta adentro. Tento colocar o cinto de segurança, mas minha velocidade não é suficiente. Ouço Todd gritar e sinto as batidas do carro que capotava. Sinto também meu rosto sendo cortado e barulho de vidro. De repente estou no chão.
Meu corpo dói demais para eu me mexer, não conseguia sentir minha perna, muito menos ver se ela se mexia. Sangue escorria pelo meu rosto e minha blusa estava encharcada. Porém aquele sangue não era meu.
O cheiro de óleo e gasolina era forte e o calor aumentava a cada momento. Uma porta bate ao longe, minha mente desnorteada não sobe reconhecer de onde veio o som. Todd.
"Me... Ajuda... Por favor..." As palavras saem roucas de minha garganta e tusso, uma tosse molhada de sangue. Minha cabeça gira.
Consigo mexer a cabeça levemente e vejo o vulgo torto de Todd ir embora pela floresta, pressionando um ferimento em seu tórax. Ao seu lado, o carro ardia em chamas.
Meu fim havia chegado, eu tinha certeza. O fogo se aproximava lentamente de meu imóvel corpo, que estava jogado no chão. Eu queria olhar para o céu, e uma última vez, procurar constelações, como meu pai me ensinara a fazer, e eu também estava ensinando meu irmão.
Minha testa estava uma mistura de suor e sangue, e as labaredas das chamas gritavam em meus ouvidos. Sinto o calor chegar a meu pescoço a aperta-lo, delicadamente. As mãos ardentes da morte fizeram-me respirar profundamente e fechar os olhos por um momento. Eu esperava seu beijo fatal, mas tudo o que houve foi o barulho de passos.
Um galho quebrou e os passos estavam cada vez mais próximos. Penso em Jake, e depois em Todd e a última coisa que vejo são botinas, negras e bem amarradas, se aproximarem de mim.
"Jake?" É tudo o que consigo dizer, antes de desabar e tudo ficar escuro.

JuneOnde as histórias ganham vida. Descobre agora