2. A Anomalia

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A FAMIGERADA ATT DUPLA DE ESTREIA

APROVEITEM

"Querida Lauren,

Eu sei e entendo como se sentes sobre casar-se com tais idiotas, e realmente desejo que as pessoas em volta de ti entendam também. Sua condição é inofensiva, já conversamos sobre isso. O direito de se sentir irritada com tamanha burrice por parte da sociedade é inteiramente seu.

Também entendo que seu erro lhe apresenta muitos riscos, mas peço que tome cuidado, se rebelar pode levantar suspeitas sobre sua condição mental (Que é perfeitamente saudável ao meu ver, mas não creio que os idiotas com quem convives entendam). Eu não gostaria de vê-la trancada em um hospício.

A Inglaterra é um lugar maravilhoso, porém, infelizmente, o pensamento dos cidadãos se iguala á mente minúscula e á arrogância de pessoas como seu irmão (Peço que não se ofenda, mas não gosto dele). Contudo, em tempos como o que vivemos, é preciso conhecer saídas.

Existe uma pequena cidade perto da capital, meu marido e eu viajamos para lá hora ou outra, é uma cidade turística, mas pouco conhecida. Conheci muitas pessoas com pensamentos peculiares lá. Algumas, em especial, considerariam contratá-la.

James não aprova, mas, quando nos hospedamos na cidade, eu gosto de visitar um pequeno teatro situado longe do centro. As atrações são das mais variadas, é extremamente bem produzido. Acredito que seja assim pois sua dona aceita todos os tipos de pensamento e os utiliza da melhor maneira, é de fato uma mulher muito inteligente. Meu marido não gosta das atrações, acredita que grande parte delas sejam indecentes, porém o teatro me parece a parte mais divertida de nossas viagens.

Porém, os médicos da cidadezinha não aceitam ocorrências dos participantes do teatro, acreditam que quem é aceito em tal local sofre das piores enfermidades mentais e serve apenas para a mais pura atração. Talvez a dona do teatro se interesse em tê-la como médica particular. O teatro é conhecido na cidade, eu lhe garanto, o pagamento seria razoável, não tão bom quanto o oferecido em seu último emprego, mas razoável.

Espero ver você em meu país em breve.

Com amor,

Ally

Londres, 3 de julho de 1953"

Admito que pensei que Ally estaria me arranjando um emprego que um maldito show de aberrações, minha amiga tinha o estranho hábito de ver beleza em condições mentais e físicas. Acredito que é por isso que somos amigas, ela me acha fascinante, acha meus gostos e luxúrias fascinantes. De qualquer jeito, nós precisamos trocar mais algumas cartas até que eu me convencesse de que sua proposta era aceitável. Foi quando ela me mandou o endereço de Dinah Jane e me instruiu a mandar-lhe uma carta.

A dona do teatro era educada e escolhia suas palavras com maestria. Olhando para trás, Dinah Jane escrevia de modo tão bonito que devo ter passado a confiar nela apenas pelo conforto que sua escrita me causara.

Nas primeiras cartas, a mulher agradecera meu suposto interesse, explicando-me que poucas pessoas se encontravam na capacidade de entender boa parte da humanidade, e elogiando-me por parecer ser uma dessas pessoas. Logo, ela me apresentou os valores e condições de meu trabalho no teatro, sempre usando as mais bonitas palavras. Eu aceitei.

Minha viagem estava marcada, eu não contei á ninguém além de Shane. Um dos motivos por eu pensar em hesitar era o jovem médico. Desde a partida de Ally, ele havia sido a única pessoa a quem eu poderia confiar minha terrível enfermidade.

Na verdade, Shane havia sido o único homem que me fizera questionar a existência de minha condição. Ele tinha algo perto de minha idade, um pouco mais velho, olhos azuis e cabelos castanhos, o homem falava de modo calmo e nunca levantava sua voz. Sua personalidade era o que mais me fascinava. Shane era precioso demais para a realidade em que vivíamos, ele nunca me negara um abraço ou algumas palavras gentis, o mais velho provavelmente fora o único homem a admirar minha escolha de vida.

Mas eu não consegui amá-lo do jeito que ele merecia ser amado.

Antes de tudo o que me acontecera, eu nunca seria capaz de admitir o que irei admitir agora. Eu aprendera a aceitar que algo estava errado comigo, mas, até que eu a conhecesse, eu não aprendera a falar tal defeito em voz alta.

Eu sou incapaz de amar o sexo oposto.

Sou incapaz de sentir qualquer tipo de luxúria por seu corpo, sou incapaz de sentir vontade de beijar-lhe os lábios e manter-me em seus braços por horas, sou incapaz de olhar para sua anatomia e sentir o que a anatomia feminina me traz.

Não creio que exista um diagnóstico ou tratamento conhecidos para o que me acontece no momento em que escrevo isso, porém, eu tenho a noção de que existe uma terrível anormalidade ainda não desvendada em meu cérebro. Eu rezo para que, em um futuro talvez próximo, se descubra mais sobre minha condição e se invente um tratamento aceitável. Eu não gostaria de ser jogada em um hospício como acontece a maioria dos anormais nos dias em que vivo.

Contudo, Ally nunca acreditara que minha anormalidade era um problema. Eu nunca me convencera, afinal, já mencionei a estranha obsessão de minha amiga por aberrações e anomalias.

Eu costumava procurar constantemente por uma cura. Sozinha, sem a ajuda de profissionais, eu passara pelas piores experiências. Até hoje, não gosto de falar sobre tudo o que me aconteceu durante meu processo de procura por um tratamento, mas eu acredito que parte de meu ódio pela sociedade em que vivo vem pela sua falta de aceitação em relação a anormais como eu. Talvez eu não mereça tal aceitação, talvez minha condição seja tão obscena e perturbadora quanto se retrata. Mas eu parara de me perguntar isso quando conheci Shane.

Shane descobrira sobre minha procura por um tratamento quando, acidentalmente, eu creio, ele lera um artigo que eu deixara á vista em minha mesa. Acredito que ele nunca teria ficado ciente de minha anormalidade se eu não tivesse desabado em sua frente quando o mais velho me perguntara sobre tal artigo. Porém, desde aquele dia, Shane fizera seu melhor para me ajudar em meu processo de cura, por mais que ele odiasse quando eu chamava meu processo desse jeito.

Não me recordo de quando eu parei de procurar uma cura em particular, mas tenho certeza de que fora cerca de um mês antes de meu erro.

Meu amigo acreditava que eu não necessitava de cura alguma, mas eu nunca concordara com ele, pelo menos não até minha partida de Miami. De qualquer jeito, Shane tivera grande influência em minha aceitação de quem eu atualmente sou. Por mais que eu tivesse extrema dificuldade de admitir. Porém, eu não creio que ele tenha recebido qualquer uma de minhas cartas.

Hoje em dia, eu admito tal fato facilmente, mas, eu nunca o admitiria sem a ajuda dela. De qualquer jeito, falarei disso depois.

Era uma madrugada nublada no final de julho quando eu agarrei meus bilhetes de navio e retirei minhas malas de um esconderijo que eu encontrara uma semana antes de minha viagem. Antes de abrir minha porta da frente, eu escrevi-lhes um breve bilhete. Nada além de "Não fui sequestrada, encontro-me seguindo minha paixão".

Por minha família, eu não sentia nada além de pena. Lembro-me de desejar que eles aceitassem meus pensamentos, desse modo, tudo teria sido mais fácil. Mas meus familiares são apenas membros comuns da sociedade americana, não posso culpar-lhes por minha opressão, apenas posso sentir-me mal por eles. No dia em que fui embora, eu ainda pensava ser a maior das pecadoras, a maior das aberrações, e sentia a pior das mágoas. Já, agora, sei que sou tudo isso, mas não sinto mágoa alguma. Aceito e aprecio tal fato.

Eu deixei Miami por volta do meio dia, não sei até hoje se alguém procura por mim.

Acredito que os detalhes da viagem de barco sejam inúteis para este relato. De qualquer jeito, embarquei na Inglaterra em uma típica tarde nublada europeia.

Sinto que sentirei dificuldades e minhas mãos tremerão um pouco durante a escrita dos acontecimentos ocorridos após minha chegada. Mas eu os relatarei.

A PARTIR DOS PROXIMOS CAPS COMEÇA A AÇAO ALOKA

Dark Times - Camren (Horror!Fanfic)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora