Capítulo Nove: Sadie.

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"Everyone's searching but nothing's revealing, everyone's looking for the reason why, everyone's hoping for life everafter, everyone's looking at death from the sky." Face in the sand, Iron Maiden.

Passei o caminho inteiro de volta para casacoçando a minha mão. Minhas unhas cravavam na pele que descava conforme o tato.Dor. Doía bastante, mas pelo menos conseguia me conter. Não tinha vontade dechorar, não tinha vontade de gritar. Simplesmente sentia minha garganta sefechar como se estivesse me afogando, minhas bochechas queimavam e percebia queo motorista me olhava de relance, mas eu não respondia o olhar.

 Como vivia no meio do nada, bem no meio do alto da boa vista, precisávamos deJake. Na verdade, eu precisava dele e Lúcia também, porque transportepúblico por aqui era quase impossível. Este era o lado ruim, o lado bom era quealém da minha casa ser enorme, era tão distante e tão no meio da mata queparecia ter saído de um livro de ficção.

Jake era o apelido que tinha dado ao motorista/mordomo. Ele cuidava de mim hátanto tempo quanto Lúcia, e um dia enquanto via a uns de meus filmes favoritos,Penelope, a garota com cara de porco que sai em busca de sua liberdade, chegueia conclusão de que nossos mordomos eram iguais.

 Então, assim virou Jake.

Cheguei a casa e passei voando para o banheiro, a vontade de gritar aumentava,tirava a roupa com tanta raiva e força que as unhas rascavam a minha peledeixando traços vermelhos. Entrei no boxe e o mundo girava ao meu redor, estavasedenta de raiva, culpa, tristeza e saudades.

 Muitas saudades.

Debaixo da saboneteira estava escondida a lamina da minha gilete, com movimentosrápidos e fortes fui deixando as marcas em minha perna. No início a dor erapouca, mas aumentava conforme o vermelho ia pintando minha coxa, levandoconsigo todas as minhas frustrações.

 Nina.

Mordia o lábio para aguentar a dor, não a dor psicológica, pois esta já foraembora, mas sim a dor que sentia em minha perna. Quando entrei debaixo d'água,o ardor tomou conta de meu corpo e mordi a mão para evitar o grito. Doeu, doeumuito, mas esta dor conseguia suportar.

 Terminei meu banho e limpei com cuidado meus machucados. Não era a melhor opçãopara lidar com toda aquela borbulha, mas era a única que a fazia desaparecer.Hoje na detenção, enquanto morria de tédio, fui passear por uma das salas queficava atrás das nossas mesas, ali encontrei um jornal, um único jornal que pareciaestar perdido, ao mesmo tempo em que parecia uma ironia do destino para acabarcomigo.

Uma das matérias de destaque era o julgamento do caso de Nina. No dia em queminha amiga tentou se matar, ela tragou um punhado de medicamentos extremamentefortes. Nós não tínhamos ido ao colégio, pois eu estava doente e ela não queriair sem mim. Lembrava-me do meu telefone tocar no meio da noite com os policiaisme pedindo para comparecer na delegacia para prestar depoimento.

 Eu queria ter passado no hospital antes, queria acreditar que tudo aquilo eramentira.

Mas não era.

 Passei a noite inteira na delegacia prestando depoimento, falando como era ocolégio, como sofríamos e como Nina odiava aquele lugar. A impressa adorou ocaso e fez questão de seguir cada passo do julgamento, já que seus pais botaramo colégio na justiça pela negligencia em relação ao que acontecia lá dentro.

Até agora não entendia o que a polícia tinha a ver com aquilo.

 Foi notícia no país inteiro, várias pessoas mandando mensagens de força para afamília, o colégio contratando os melhores advogados, jornalistas no hospital, ecomo sempre, tudo foi sendo esquecido, tudo se tornou indiferente.

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