Capítulo 1

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Laura

Olhar para esta sala antes dos alunos entrarem em seu primeiro dia de aula tornou-se meu vício particular. É sempre assim. Todo começo de fevereiro chego absurdamente cedo, faço um café especial com direito a frutas variadas, pães frescos, café e sucos. Faço questão de proporcionar, a minha maneira, um começo de ano maravilhoso a todos os meus colegas de trabalho. Aprecio demais todos eles.

Chego a sala, analiso a parede colorida, o enorme mapa mundi pintado em uma parede inteira e a grande lousa de vidro trocada um ano após minha permanência aqui no Jardim Elite. Observo minha mesa de vidro com protetores nas extremidades; sobre ela, um delicado arranjo de Lírios e uma plaquinha pequena indicando meu nome: professora Laura Marins. Todo o conjunto da sala exala sofisticação e riqueza para atender as expectativas de pais poderosos e bem sucedidos.

Desde pequena sonhei em me tornar professora, inspirada sempre em meus pais, que também lecionavam. Atualmente eles estão aposentados e curtindo a melhor idade em viagens pelo mundo afora. Gosto da vida que levam. Depois de terem me educado, pagando as melhores escolas e investindo em mim, acho justo gastarem energias descobrindo novas culturas e povos, afinal, sempre fora o sonho deles.

Desvio-me de meus pensamentos e vou até minha cadeira; sento-me e começo a separar perguntas que irei fazer para os meus preciosos novos alunos, todos com seus quatro anos de idade. Gosto de começar com perguntas para conhecer a capacidade intelectual de cada criança, pois me ajuda a trabalhar de formas diferenciadas em cada uma, dependendo de seu grau de dificuldade. Aqui no Jardim Elite, as crianças são ensinadas em duas línguas, o português e o inglês, desde que ingressam na pré escola. Somos duas professoras e duas auxiliares, eu ministro somente os idiomas, três vezes por semana, utilizando todo o artifício necessário para estimulá-los, observando a maturidade de cada um para com o aprendizado. Um sistema de ensino elevado de uma escola prestigiada e considerada a melhor da cidade, onde eu também fui aluna.

De repente, ouço um toque na porta e consulto o relógio rapidamente antes de atender ao visitante. Estranho não ver nenhum dos colaboradores, afinal, ainda são 6h:45min., cedo demais para já ter algum responsável querendo falar comigo no dia da celebração de boas vindas. Sigo em direção à porta.

- Bom dia! Sou a professora Laura Marins, posso ajudá-lo em algo? - Definitivamente ele não era pai de aluno, tinha uma aparência juvenil, algo em torno dos vinte e cinco anos.

- Bom dia, professora Laura. Sou Bruno Mascarenhas, irmão de Virginia Mascarenhas, sua aluna que iniciaria na escola, amanhã. Passei na secretaria para informar ao coordenador de que minha irmã não poderá participar da primeira aula, pois chegará de viagem somente daqui a duas semanas. Ele me orientou, e também achei necessário avisá-la sobre a falta. - Olho atentamente para seu rosto bonito, que depois de alguns segundos, continuo a olhar fixamente, encantada. Enrubesço na hora e desvio o olhar para depois encará-lo com calma.

- Sr. Mascarenhas, aprecio o sr. vir esclarecer a falta da aluna Virginia, mas ela perderá muitas aulas em duas semanas. Sou a professora que ministrará aulas de Inglês e Português. Nosso ensino é bem elevado, por isso é necessário a interação desta primeira aula para melhor conhecê-los e atender suas necessidades. O sr. consultou o cronograma, certo?

- Conheço o cronograma e também não há o porquê de tantas explicações. Já conversei com o coordenador e me certificou de que você poderá ajudá-la com aulas extras. Resolvi passar aqui e avisar pessoalmente porque o sr. Lopes me garantiu que você é uma excelente professora. - Ao dizer isso, sua expressão torna-se severa, demonstrando impaciência. Encaro-o de forma determinada.

- Recompensarei as aulas perdidas da melhor maneira, Sr Mascarenhas. Agora, se não houver mais nada, voltarei ao trabalho. - Estendo as mãos para me despedir e sorrio. - Foi um prazer conhecê-lo.

- Não há mais nada. Obrigado pela compreensão. - Sua expressão suaviza ao tocar minha mão estendida. Sinto uma carga elétrica jamais vivenciada; imediatamente minha face queima. Provavelmente eu estou muito vermelha, pois ele sorri e parece se divertir. Olho para o chão e aparto o contato. - Foi um prazer conhecê-la, Laura. E a propósito, pode me chamar de Bruno. - Quando retorno a olhá-lo, ele já está se virando. Fecho a porta quase imediatamente e sigo em direção a mesa. Sento-me pesadamente e sorvo um gole da minha garrafa d'água.

O que aconteceu aqui? Será que me comportei de forma equivocada? Será que desta vez demonstrei a verdadeira insegurança de uma garota de dezenove anos, e não a de uma mulher de quarenta, como meus parentes costumavam dizer?

O fato é que meus pais sempre investiram pesado em minha educação, pagando escolas caras consideradas as melhores, não me dando tempo para pensar em garotos; nem se eu quisesse. Nunca deixei por menos: sempre tirei notas altas. Meu pai quisera que eu estudasse inglês, e minha mãe morria de paixão por francês, portanto, decidiram me inscrever em ambos os cursos; o primeiro aos 4 anos e o segundo aos 8. Minha vida sempre fora estudar, tirar boas notas e orgulhar meus pais, mas o último era um desafio. Eles me instigavam e exigiam o melhor de mim, o que me assustava às vezes, mas sempre consegui superar a expectativa de ambos e isso me tornava uma filha bastante invejada entre seus amigos. Não que eu me ache melhor que qualquer garota da minha idade, mas acredito que a educação que eles me deram proporcionou-me um amadurecimento precoce em relação aos meus estudos e objetivos. Hoje, aos dezenove anos, acabara de me formar em Letras numa idade record, para uma filha que sempre bateu seus records acadêmicos. Ingressar na faculdade aos dezesseis, e com louvores, foi o ápice de felicidade para meus progenitores.

Sentir o que senti pelo Bruno Mascarenhas com certeza é algo novo. Nunca me interessei em namorar ou em ficar com garotos até o dia que, aos treze anos, minha amiga Lívia resolveu deliberadamente armar um encontro no bosque perto de casa, com um garoto para eu perder o bv. Imaginem só, eu beijar alguém que não conheço só para perder a virgindade da boca, fala sério! Quando ficamos à sós, o menino veio todo cheio de si, pegando em minha nuca e forçando uma aproximação não solicitada; quando tentei afastá-lo, ele já havia colado sua boca na minha. Aquilo me deixou irritadíssima e essa onda de fúria refletiu diretamente em sua região pélvica, onde chutei com toda minha força. Imediatamente ele caiu no chão e eu o olhei horrorizada. Depois disso, saí correndo semelhantemente a Usain Bolt - hipérbole à parte - mas sim, corri muito, e rápido, a ponto de ficar com os pulmões ardendo quando cheguei a casa.

No dia seguinte, na escola, alguns me olharam como se eu fosse um E.T, outros zoaram e chamaram-me de lésbica ou estranha. Minha reputação antes era apenas Nerd, depois passou a ter um acréscimo nada criativo: BEM Nerd - Beija Estranhamente Mal Nerd. Um apelido "estrategicamente" elaborado para não chamar a atenção dos professores. Se acham que fiquei chorando semanas por um apelido sem graça que me deram, enganam-se. Ri horrores ao descobrir o significado do apelido semanas depois. Importava-me apenas uma coisa: estudar. O resto, era resto. Desde então, não beijei mais ninguém. Já pensei várias coisas à meu respeito por não me atrair por ninguém, logo, classifiquei-me assexuada.

Bem, esta definição caiu por terra hoje.

Quando pensava nunca sentir nada pelo sexo oposto, eis que surge este homem do além para tornar questionáveis minhas convicções. Será que essa eletricidade que senti mediante seu toque é o que Darwin cita em seus estudos sobre a evolução da vida? Mas isso não é um sentimento despertado apenas em "machos", destinado a reprodução? Ah, quantas dúvidas! Será que ele sentiu a mesma coisa que eu? Se sim, por que ele riu? Por que não foi mais gentil e educado, ou por que não pediu meu telefone, talvez? Será que somente eu senti aquilo? Checo a hora e já são 6h:57min., para meu espanto. Este devaneio consumiu mais tempo cronológico do que o psicológico.

- Preciso correr - falo em voz alta.

Ando apressadamente em direção ao auditório onde será celebrada a festa de boas vindas aos alunos e responsáveis. Depois, solicitarei uma conversa com o Altair, a fim de explicar-me o que o sr. Mascarenhas quis dizer ao mencionar "aulas extras".

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