Prólogo

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Este era o terceiro dia de Elizabeth em Netherfield. Ela viera cuidar da irmã, Jane, que se adoentara durante sua visita às moças da casa. Durante sua estada, Elizabeth se interessara pela leitura das seleções encontradas na biblioteca do sr. Bingley. Embora não fosse uma leitora ávida, e tivesse prazer com várias outras atividades, Elizabeth achava que um livro poderia mantê-la ocupada à cabeceira de Jane e estava curiosa para ver o que a biblioteca de Netherfield tinha para lhe oferecer. A curiosidade de Elizabeth se aguçara com a declaração do sr. Bingley de que sua biblioteca estava incompleta, pois ela sabia que deveria ser muito superior à de seu próprio pai pelo simples fato de que a fortuna do sr. Bingley era muito maior.

Elizabeth também estava ciente de que o sr. Darcy apreciava bastante a biblioteca. De fato, era lá que ele passava a maior parte de suas horas livres, e Elizabeth sorriu para si mesma ao tentar imaginar se seria pelo fato de que as mulheres das casa raramente entravam naquele cômodo. Pois Elizabeth aprendera duas coisas durante aquele tempo em Netherfield das quais ela não tinha dúvidas: que a srta. Bingley estava decidida a conseguir que o sr. Darcy se tornasse seu marido, e que o sr. Darcy se sentia profundamente irritado com seus avanços. Assim, Elizabeth se vira impedida de visitar a biblioteca não só por precisar fazer companhia à irmã, mas também pela constante presença do sr. Darcy no local, pois não desejava estar em sua companhia.

Na verdade, Elizabeth gostava cada vez menos daquele homem. Ele era o homem mais orgulhoso, frio e desagradável que ela já conhecera. Era espantoso que uma pessoa tão simpática e amigável como o sr. Bingley pudesse manter uma amizade tão estreita com alguém como o sr. Darcy. Na noite em que ela o encontrou pela primeira vez, Elizabeth o ouvira rejeitá-la como parceira de dança e sentiu repulsa por seu orgulho e pretensão. Desde então, ela o pegara, por mais de uma ocasião, observando-a com uma expressão crítica, deleitando-se, sem sombra de dúvida, com os defeitos que achava nela e em sua família, e se regozijando com sua própria superioridade.

Elizabeth estava certa de que os sentimentos do cavalheiro em relação a ela eram, no mínimo, tão desagradáveis quanto os dela por ele. Ele havia indicado claramente sua opinião desfavorável a seu respeito na mesma noite em que se encontraram, embora ela não tivesse certeza se ele percebera que ela o havia escutado, o que não a preocupava. Desde que ouvira dele mesmo esta expressiva informação sobre o que pensava dela, Elizabeth não notara nada vindo dele que pudesse modificar a idéia que ela tinha sobre os sentimentos dele em relação a ela. Ele parecia estar sempre procurando por defeitos nela e em sua família e conhecidos, e normalmente mostrava um olhar de desaprovação.

Elizabeth não tinha razão para questionar a própria e embasada opinião de que o sr. Darcy não sentia nada mais que desprezo por ela. Portanto, estava alheia ao fato de que a opinião dele a seu respeito havia se modificado de tal maneira que ele passara a admirá-la. Ele mesmo se sentia chocado e mortificado com os próprios sentimentos. Ele se pegara observando-a, escutando-a e desejando falar com ela. Ela era diferente de qualquer outra moça que ele já conhecera. Ela não tentava impressioná-lo empregando os mesmos subterfúgios que tantas vezes ele vira em outras. Na verdade, ela discordava dele abertamente e desafiava seu julgamento e opiniões. Ele mal podia se lembrar de alguma outra jovem que se arriscasse a ter uma opinião diferente da dele em qualquer assunto. Ela não parecia interessada em conquistar o seu apreço. Era autêntica e, gostassem dela ou não, não tentava adaptar sua personalidade em benefício de quem estivesse ao seu redor.

O sr. Darcy foi também conquistado pelo jeito descontraído e brincalhão de Elizabeth. Estava impressionado com sua astúcia e sua vivacidade, assim como com sua inteligência. E embora ele a houvesse recusado como parceira de dança com a desculpa de que ela não era bonita o bastante para ele, começava a notar que sua figura era delicada e agradável, e questionava-se por não ter percebido antes a graça de suas feições, e em particular a beleza de seus olhos que emprestavam ao seu rosto um ar de incomum inteligência. Para ela, no entanto, ele era apenas o homem que não a achara bonita o suficiente para acompanhá-lo na dança e que não se mostrava simpático em ocasião alguma.

O sr. Darcy estava tão impressionado com a srta. Bennet que começara a sonhar com ela na mesma noite em que se conheceram. Foi um sonho muito agradável, e assim que a frustração por ter acordado se dissipou, ele se repreendeu por ter tido tal sonho. Ele sonhava com ela todas as noites desde então, mas recusava-se a admiti-lo. A lembrança dela também preenchia seus dias, mas ele tinha mais controle sobre os próprios pensamentos durante o dia, e se esforçava em ocupar a mente com outras coisas.

Não estava contente consigo mesmo depois de tais reflexões e estava decidido a não se envolver emocionalmente com a jovem, já que sua razão lhe dizia que ele nunca poderia se casar com ela. Era verdade que ela não tinha fortuna, nome ou status, mas era igualmente verdade que ele não precisava de tais qualidades numa esposa, já que possuía o suficiente das três. Estas considerações, no entanto, certamente não seriam suficientes para derrotar um amor tão forte quanto o que se estava desenvolvendo, embora ele ainda não estivesse preparado para tomar consciência da força de seu próprio sentimento. Mas ele tinha outras objeções. Na verdade, a maior objeção que fazia quanto à conveniência de ter Elizabeth como esposa se referia à família dela, particularmente ao comportamento impróprio das irmãs mais novas e da mãe, e algumas vezes até mesmo do pai. Embora a sta. Elizabeth e a irmã mais velha sempre se comportassem de maneira irrepreensível, ele sentia que uma ligação com tal família o colocaria em uma posição altamente censurável. Mesmo assim, era cada vez mais difícil resistir ao charme de Elizabeth e, para seu próprio espanto, viu-se enfeitiçado como nunca estivera antes. Confuso, o sr. Darcy ficou sujeito à ansiedade causada pela consciência da presença permanente dela na mesma casa em que ele se encontrava e assim, no terceiro dia da estada de Elizabeth, ele ainda não decidira se o fato de ela estar em Netherfield o agradava ou desagradava. Seu coração e sua mente estavam em constante conflito em relação à srta. Elizabeth Bennet.

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