Os papéis sobre a mesa eram os que apresentaríamos no domingo, o computador estava fechado e as canetas escapando do estojo preto. Havia um livro. Nietzsche, a genealogia da moral.

Eu gostava daquele livro. Foliei as páginas procurando por algum tipo de anotação, mas ele não era como eu. Eu escrevia minhas interpretações em cada livro que lia, ele mantinha as página em branco, pelo que podia ver pela marcação, ele ainda não tinha terminado.

David ainda era uma dúvida. Eu não o conhecia, como poderia confiar nele sem saber de nada. Puxei a gaveta encontrando mais papéis. Comecei a achar que estava violando a privacidade dele com minha curiosidade, mas então, algo soltou em meus olhos. Algo que me fez duvidar de tudo.

David já não era mais a pessoa que eu conheci na segunda, ou que me beijou no carro. Ele passou a ser um estranho, um intruso na minha casa.

Peguei o gordo envelope com meu nome. Reconheci a letra de Kenny. Ele sempre fizera um A exagerado quando escrevia meu nome.

O rasgo no lacre antigo do emblema de cera me dizia que não era uma coincidência ou um mero mal entendido.

A porta então se abriu me assustando. A primeira reação de David ao me vez foi de surpresa, mas quando seus olhos chegaram em minhas mãos, eu pude ver um certo temor.

Ele não disse nada de início, mas meu olhar o fez engolir em seco. David sabia que não havia nada a se dizer, seu silêncio mostrava sua culpa e tudo que eu queria saber era o porquê.

Coloquei a mão dentro do papel pardo tirando os papéis presos por um clips. Eram muitas páginas, haviam anotações e marcações diversas, setas indicado partes. Não me preocupei em ler nada porque sabia do que se tratava.

- Por que? - disse sem olhá-lo nos olhos.

Estava desapontada. Não consegui ficar irritada ou com raiva.

David não respondeu.

- Você tá fora. Pega suas coisas, um carro vai te levar para casa. Eu só...

- Por favor, não. Eu não posso perder isso. Eu precisei pegar o envelope. Esse emprego é minha única chance de mostrar aos meus pais que eu posso ser melhor que o meu irmão, se eu recomeçar em qualquer outro lugar, eu vou começar de baixo. Eu não posso fazer isso.

- Por que você pegou o envelope? Ou por que você foi estupido suficiente para não destruir ele?

- Eu devia entregar ele a sua tia. O que tem aí dentro destruiria tudo o que estamos trabalhando.

- Estamos? Quem é a outra pessoa eu ou a minha tia?

- Eu não sei! - ele disse irritado, mas consigo mesmo - Um dos empregados estava levando o envelope para você e o peguei. Quando eu vi o que tinha lá dentro, eu contei a Sra. Brooks. Ela disse que você não deveria colocar as mãos nele. Tudo que tem aí vai destruir o legado dos seus pais. Ela não vai permitir que isso aconteça. Eu não posso.

- Porque você acha que tem o direito de interferir na minha vida, ou de ter qualquer tipo de opinião? Eu esperava isso da minha tia, mas de você? Tudo pelo que? Um emprego? Um legado dos meus pais que ela claramente detestava? - parei de falar recuperando meu fôlego e minha calma - Sabe de uma coisa, você pode ficar. Aproveite tudo isso, eu ainda não sei o que tem aqui, mas diga a minha tia que eu vou tirar dela tudo que é meu. Que ela pode desocupar todas as casas que ela achou que ficariam para ela, ela pode parar de usar os carros. Ela não vai tocar em mais nada que o legado dos meus país, que ela tanto se preocupa, me deixou.

- Aurora, você não está pensando direito.

- Ainda não. Eu vou ler um pouco agora, e de noite, vamos ter uma pequena reunião. Enquanto isso, você pode decidir se vai seguir com a minha tia, ou se vai ficar do meu lado.

Passei por ele saindo do quarto e fui direto até o quanto de Aziz.

- Preciso da sua ajuda - disse tirando os papéis do envelope e os espalhando sobre a cama - Eu preciso saber o que eu tenho e como vou usar isso contra a Sra. Brooks.

- Finalmente a Aurora que eu conheço.

- Nós vamos à guerra? - Alia se apoiou no batente da porta com os braços cruzados.

- Nós vamos à guerra - afirmei pegando uma parte dos papéis e levantando para que ela pegasse.

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