Capítulo 79

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O caminho que percorríamos era silencioso e vazio. Uma estrada perdida entre a areia da praia e a floresta. Tinha apagado após entrar no carro, não era confortável mas era veloz. Não trocamos nenhuma palavra durante o percurso, pude perceber um brilho naqueles olhos negros, mas não consegui identificar o que queria dizer. Duas horas de viagem me fizeram enjoar, então pedi que parássemos um pouco. O visual era bonito, entardecer, poucas nuvens no céu, um vento agradável. Sai do carro e caminhei um pouco, as pernas dormentes de tanto ficar sentada. Euro também estava cansado, mas a euforia em chegar era muito maior.

– Você está com fome?

– Não.

– Tudo bem. Não quer conversar?

– Sobre o que? Sobre como será minha morte e sua ressurreição?

– Cruel. Mas não acredito que ele vá te matar, deve precisar de você para algum plano maligno, nada além disso.

– Me sinto mais confiante, obrigado – sorri sarcástica.

– Você me julga como se eu tivesse culpa, só sou subordinado, nada mais.

– Não estou te culpando, só que por algum momento, naquela noite que você me salvou, eu pensei que pudesse contar com você. Que era alguém bom, só um pouco reservado. Confiei em você e agora estou aqui – Euro deu dois passos, chutou levemente as rodas do carro e sorriu.

– Aquilo foi obra de Hades, uma armação para conquistar sua confiança.

Sorri também, era tolo demais para ser verdade. Óbvio que era uma armadilha para me conquistar, como pude ser tão idiota. Uma ponta de raiva brotou no meu peito, mas pude contê-la, pra que me desgastar? Estava lá, a caminho do encontro que mudaria a minha vida, por que me preocupar em 'como' se o 'pra que' era mais importante – Não vai me xingar, nem gritar?

– Não Euro, não tenho por que fazer isso.

– Que bom, você é mais madura do que imaginei.

– Sabe, tenho levado tantas rasteiras, tantas quedas. Você era um desconhecido, eu que fui burra em não dar ouvidos a um amigo como Davi. Poderia ter evitado isso, não ter facilitado a sua caçada. Você provavelmente nunca me encontraria sozinho, ninguém na cidade lembrava de Sebastian. A presa direto para o predador, simples assim.

– Você pensou que pudesse realmente encontrar Sebastian?

– Tenho esse problema de acreditar em qualquer coisa que me dizem, pior, confio em qualquer coisa que me contam. Talvez essa lição me ensine o quanto uma pessoa pode ser dissimulada, pena que não vai me servir pra nada essa lição.

– Já disse que Hades não vai te matar, por que o drama?

– O que ele quer comigo então? Um jantar romântico? Conversar sobre política e ecologia? Pode não me matar de imediato, mas obviamente vai me usar para algum ritual ou troca, só que Zeus não parece ser bom com negociações. Resumo da ópera: eu morro.

– Você tira conclusões drásticas pra tudo na vida?
– Não. Mas raciocina comigo, se Sebastian tivesse ficado, se ele tivesse esquecido a visão daquela mulher louca e ficado comigo. Se tivéssemos casado eu estaria agora caminhando para a morte? Segundo a premonição ele mataria nosso filho e depois eu me mataria. Consegue ver? De qualquer forma eu morro! Mesmo se eu nunca tivesse lembrado de Sebastian, mesmo que você não me achasse... eu morro no final. Mas a questão é, por que sofrer tanto antes disso? Eu não tenho mais forças para lutar, como aquela pressão, que me sugou, me invadiu, eu me sinto assim diariamente. Enjaulada em meus sofrimentos, presa as minhas meias verdades. A morte vai levar isso ou pelo menos amenizar.


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