Ainda que eu chore sozinha...

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Eu estava destruída.

Não com o fim em si, mas com a sensação de ter perdido um ano inteiro da minha vida ao lado de alguém como o Henrique. A raiva queimava em mim, mas por baixo dela existia algo pior — o vazio do tempo desperdiçado, da confiança jogada fora, da ingenuidade que eu tanto jurei não repetir.

A dor que eu sentia não era pelo término, era por tudo que ele representava. Por todas as vezes que eu o defendi, que o perdoei, que acreditei que ele era diferente. E agora, olhando pra tudo, parecia tão óbvio, tão estúpido.

Por um momento, cheguei a pensar se a culpa realmente não tinha sido minha. Se talvez cancelar a viagem em cima da hora tivesse sido o estopim, se eu realmente tinha deixado ele se sentir abandonado o bastante pra fazer o que fez.

Mas essa hipótese se desfez tão rápido quanto surgiu. Porque a verdade é que ninguém trai por acidente. E se ele teve coragem de fazer isso uma vez, quem me garante que não tinha feito antes? Que outras desculpas covardes ele teria usado pra justificar?

Subindo os degraus das escadas de emergência, senti o peso do corpo inteiro. As pernas doíam, o peito ardia, e pela primeira vez desde que cheguei ao Rio, eu não tentei conter o choro.

Deixei sair.

Chorei pelo que aconteceu, mas também pelo que não aconteceu. Chorei pelo tanto que engoli nos últimos dias, pelas palavras que ficaram entaladas, pelos sentimentos que eu insisti em fingir que não existiam. Foi como se tudo finalmente tivesse encontrado uma brecha pra escapar — toda a raiva, toda a culpa, toda a dor que eu vinha empurrando pra um canto.

E, no meio disso tudo, o pensamento que eu mais odiei ter me atravessou como uma lâmina:
o quanto eu quis correr até Bang Chan.

Quando vi ele na escada, com aquele semblante preocupado e a voz calma, o mesmo tom brando que sempre me desmontava, uma nostalgia estranha me tomou e tudo em mim quis ceder. Eu só queria me jogar nos braços dele, sentir o abraço forte que sempre parecia me segurar inteira quando o mundo desabava. Queria chorar ali, escondida no peito dele, e fingir que o resto não existia.

Mas eu não fiz.
Eu não podia fazer.

Porque era exatamente isso que me colocava de volta no mesmo ciclo — de entrega e depois de dor. E eu não suportaria reviver tudo outra vez.

No fim, essa era a verdade que eu não conseguia mais negar: o que existia entre nós sempre terminaria em dor.

Dor por ter que dizer adeus.
Dor pela distância.
Dor pelo que nunca poderíamos ser.

Quando empurrei a porta das escadas e cheguei ao terraço, o vento frio da noite me atingiu de uma vez, gelando o rosto quente por causa do choro. O espaço era bem iluminado e amplo, tinham alguns vasos com plantas espalhados com pontos de luzes iluminando os diferentes tons de verde das folhagens. Por alguns segundos, só fiquei ali parada, respirando o ar pesado e salgado que vinha do mar, tentando recuperar o fôlego que parecia preso dentro de mim. Eu só queria que o mundo ficasse quieto por um minuto — sem gritos, sem desculpas, sem ninguém tentando me convencer de nada.

Mas, claro, nem isso o universo quis me dar.

Porque quando levantei o olhar, percebi que não estava sozinha. Havia alguém encostado no guarda corpo, de costas, o corpo levemente curvado pra frente, fones nos ouvidos. Pensei em dar meia-volta antes que me notasse, mas tarde demais. Ele se virou.

E então eu congelei.

Seungmin.

Por um instante, só consegui olhar pra ele — o tempo inteiro que passei sem ouvir a voz dele, sem cruzar aquele olhar, pareceu se misturar a tudo o que eu estava sentindo. Ele tirou os fones devagar, os olhos se fixando em mim, confuso.

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