Capítulo 21 - Maria Vitória (Mavi)

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O peso da culpa parecia grudado na minha pele, sufocante. Era uma sensação que não passava, que me acompanhava em cada passo, cada olhar, cada pensamento que eu tentava ignorar. Eu sabia o que tinha acontecido. Sabia o que Falcão tinha feito.

E, pior, sabia que, no fundo, uma parte de mim estava aliviada.

Essa era a pior parte.

Eu deveria me sentir horrorizada. Chocada. Enojada.

Mas tudo que eu sentia era o peito pesado, uma confusão absurda rodando na minha cabeça, e aquela atração maldita por ele queimando ainda mais forte.

Deixei a mochila cair no chão do quarto e me joguei na cama, encarando o teto, tentando fazer o coração desacelerar. Eu não conseguia apagar a cena da minha mente, por mais que tentasse. A forma como Falcão me segurou naquela noite, como prometeu que ninguém jamais encostaria em mim.

A intensidade no olhar dele. A segurança absoluta nas palavras.

E, agora, aquele homem estava morto.

Eu não tinha visto. Não perguntei detalhes. Mas eu sabia. Sabia porque, quando olhei para Falcão depois de tudo, havia algo diferente nele.

Ele não precisava dizer nada.

Eu fechei os olhos com força, sentindo a respiração sair pesada. A culpa pesava como uma corrente em volta do meu pescoço, me puxando para baixo. Mas o pior era que, em meio a tudo isso, existia um calor perigoso rastejando pela minha pele, pulsando no meu estômago, arrepiando cada centímetro do meu corpo quando eu lembrava da forma como ele olhava para mim.

Um homem morreu. Eu deveria me sentir mal.

Mas, no fundo, eu só conseguia pensar nele.

E era isso que me aterrorizava mais do que qualquer outra coisa.

[...]

Desci as escadas com a intenção de pegar um copo d'água e evitar qualquer contato com Falcão, mas foi minha mãe quem me encontrou primeiro. Ela estava na cozinha, mexendo em uma panela no fogão, e virou o rosto na mesma hora que me viu.

— Você tá muito quieta esses dias. — A voz dela veio carregada de preocupação, o olhar atento me analisando. — Aconteceu alguma coisa?

Engoli em seco, desviando o olhar rapidamente.

— Nada demais. Só coisa da faculdade.

Minha mãe franziu a testa, secando as mãos no pano de prato antes de cruzar os braços.

— Você tem certeza? Porque cê anda muito pensativa.

Eu sabia que ela não ia engolir minha desculpa tão fácil. Ela sempre teve esse dom irritante de perceber quando eu estava mentindo. Mas eu não podia dizer a verdade.

Não podia dizer que seu marido tinha matado um homem por minha causa.

Que, em vez de me sentir mal, eu só conseguia pensar no toque dele, na forma como ele me protegeu, no desejo absurdo que crescia dentro de mim cada vez que eu lembrava dos olhos dele me segurando no terraço naquela noite.

Respirei fundo, forçando um sorriso fraco.

— É sério, mãe. É só cansaço.

Ela me analisou por mais alguns segundos antes de suspirar.

— Tá bom. Mas se precisar conversar, eu tô aqui, tá?

Assenti, sentindo um nó se formar na garganta.

Se ela soubesse...

Se soubesse o que realmente estava acontecendo dentro de mim, o que eu vinha sentindo pelo homem que dividia a cama com ela...

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