O bar não era meu lugar preferido, mas, naquela noite, era minha melhor opção. Depois dos últimos dias, eu precisava de um tempo longe de casa. Longe dele.
Sentei-me em um dos bancos perto do balcão, observando o movimento ao redor. O som do pagode misturado às vozes e risadas preenchia o ambiente abafado. O cheiro de cerveja misturado à fumaça de cigarro grudava no ar, tornando tudo mais sufocante do que deveria ser.
Pedi um refrigerante e fingi estar ocupada mexendo no celular. Mas, na verdade, minha mente estava longe. Tudo girava ao redor da mesma coisa. Do mesmo problema.
Falcão.
Eu tentava manter distância, tentava fingir que nada tinha acontecido, mas era impossível. Ele não ajudava. Cada olhar dele carregava aquela maldita provocação silenciosa, como se estivesse esperando o momento certo para me puxar de novo. Como se soubesse que eu estava prestes a ceder.
Apertei o copo gelado entre os dedos, tentando afastar esses pensamentos. Precisava me distrair. Qualquer coisa para não pensar nele.
— Tá sozinha hoje, princesa? — A voz masculina soou perto demais, e meu corpo enrijeceu no mesmo instante.
Levantei os olhos devagar, encontrando um homem alto e moreno, com cabelo raspado e uma cicatriz no queixo. O sorriso que ele carregava não tinha nada de amistoso.
— Não te interessa — respondi, tentando não demonstrar a inquietação que subiu pelo meu estômago.
Ele riu baixo, puxando o banco ao lado sem pedir permissão.
— Eu acho que interessa sim. Principalmente quando se trata de uma dívida que não foi paga.
Minha respiração ficou presa.
Meu pai.
Claro que tinha a ver com ele.
O homem inclinou-se um pouco mais, o cheiro forte de cigarro e álcool me atingindo.
— Seu velho era um malandro. Achou que podia morrer e deixar as contas pra trás? Só que as dívidas não morrem com ele, entendeu?
Me forcei a respirar fundo, mantendo o olhar firme, mesmo quando minha garganta secou.
— Eu não tenho nada a ver com isso.
Ele sorriu de lado, sem pressa, como se estivesse se divertindo com a situação.
— Ah, mas tem. Porque quando o devedor morre, quem sobra paga. De um jeito ou de outro.
O jeito que ele falou me fez querer sair dali na mesma hora.
Me levantei, tentando ir embora, mas ele segurou meu pulso antes que eu desse um passo.
— Você tá me devendo uma conversa, princesa. E eu sou um cara paciente, mas não gosto de ser ignorado.
Meu estômago revirou.
— Me solta.
Os dedos dele apertaram mais forte, e eu me preparei para reagir, mas então, do nada, alguém chamou atenção do outro lado do balcão.
— Mavi! Seu pedido tá pronto.
O homem hesitou. Foi só um segundo. Mas o suficiente para eu puxar o braço com força e dar um passo para trás.
O funcionário do bar me olhou com uma sobrancelha arqueada, percebendo a situação.
Aproveitei a brecha e saí dali o mais rápido que pude.
[...]
O vento quente da noite me envolvia enquanto eu subia o morro com a moto, mas a sensação de sufocamento vinha de dentro. Meu coração ainda batia acelerado, o estômago revirando, os músculos tensos como se minha pele carregasse cada resquício do medo que me dominou horas antes. Minhas mãos tremiam no guidão, mesmo que eu tentasse fingir que estava tudo bem. Eu não queria admitir, mas nunca havia sentido pavor daquele jeito.

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TODOS OS DEFEITOS DO AMOR
Teen Fiction[Este livro não retrata a realidade nua e crua das favelas, é apenas uma história fictícia com o intuito de entreter] ❝ Uma conexão obscena entre enteada e padrasto ❞ No meio do caos de uma invasão no morro, Falcão, dono do morro, salva Maria Vitóri...