Capítulo 8 - Maria Vitória (Mavi)

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O som abafado da respiração de Gabriel preenchia o quarto, misturado com o barulho do ventilador que girava preguiçosamente no canto. O calor parecia nos envolver, fazendo os lençóis grudarem na pele. Minha mente estava longe de tudo, focada apenas nas mãos dele deslizando pelo meu corpo, no jeito que ele me beijava devagar, como se cada movimento fosse calculado. Fechei os olhos, deixando-me levar, até ouvir o som inconfundível da porta se abrindo.

— Que porra é essa? — A voz grave e furiosa do Falcão rompeu o ar como um trovão.

Meu coração disparou. Num reflexo, empurrei Gabriel para o lado e me cobri com o lençol, sentindo meu rosto pegar fogo. Gabriel ficou paralisado, os olhos arregalados, como se não acreditasse no que estava acontecendo. A figura do Falcão enchia o vão da porta, os olhos escuros carregados de raiva.

— Sai daqui agora. — Ele apontou o dedo para Gabriel, a voz baixa, mas firme, daquele jeito que fazia qualquer um obedecer sem pensar duas vezes.

— O quê? — Gabriel finalmente conseguiu falar, a voz trêmula.

Ele me olhou, buscando alguma orientação, mas eu não consegui dizer nada. Minha língua parecia presa na boca.

— Você ouviu o que eu disse, moleque. Sai. Agora. — Falcão deu um passo para dentro do quarto, e o jeito que ele se movia, devagar, mas ameaçador, fez Gabriel se levantar tão rápido que quase tropeçou nas próprias roupas no chão.

— Falcão, você tá maluco?! — Minha voz finalmente saiu, embargada pela mistura de vergonha e raiva.

Eu não conseguia acreditar no que estava acontecendo.

— Cala a boca, Maria Vitória. — Ele me cortou sem nem olhar para mim. O foco dele estava todo em Gabriel, que tentava vestir a calça enquanto andava. — Veste essa merda de roupa e sai daqui enquanto eu ainda tô calmo.

Gabriel olhou para mim de novo, hesitante.

— Vai, Gabriel! — gritei, minha voz mais alta do que o normal. — Vai logo!

Ele finalmente saiu com a camisa em mãos, passando por Falcão sem olhar para trás. O som dos passos dele descendo a escada e a porta batendo lá embaixo foi a única coisa que me fez perceber que aquilo não era um pesadelo. O quarto ficou em silêncio por alguns segundos, mas o peso da presença do Falcão parecia sufocar tudo.

— Que merda foi essa, Falcão? — Minha voz saiu firme, mas eu tremia dos pés à cabeça.

Segurei o lençol com força, tentando esconder meu corpo exposto.

Ele finalmente olhou para mim, os olhos ainda escuros, mas a expressão no rosto tinha mudado. Era uma mistura de raiva, decepção e outra coisa que eu não consegui decifrar.

— Isso é falta de respeito. — A voz dele era controlada, mas cada palavra vinha como uma faca afiada. — Aqui não é motel, não.

— Falta de respeito? Eu tô no meu quarto! Você entrou sem nem bater! — A raiva começava a tomar conta de mim, a vergonha se transformando em um nó no peito.

— Isso aqui é minha casa, Maria Vitória. — Ele se aproximou, cruzando os braços, a presença dele parecendo dobrar de tamanho. — E, enquanto você morar debaixo desse teto, eu não vou permitir esse tipo de sem-vergonhice.

— Sem-vergonhice?! — Minha voz falhou, e as lágrimas começaram a se acumular nos meus olhos, queimando. — Você não tem o direito! Eu sou adulta, tenho 20 anos, posso fazer o que eu quiser!

— Não debaixo do meu teto. — Ele bateu a mão na porta, e o som ecoou pelo quarto, me fazendo sobressaltar. — Você pode ter 20, 30 ou 50 anos, mas enquanto morar aqui, você vai respeitar as minhas regras.

— Respeitar? Você acha que argumentar com o fato de que a casa é sua te dá o direito de entrar assim? — As lágrimas começaram a escapar, e eu as enxuguei com força, odiando que ele me visse daquele jeito.

— Dá sim. Porque, sem mim, você e a sua mãe não teriam onde morar. — A voz dele baixou, mas o tom continuava cortante. — Então você vai me respeitar.

Antes que eu pudesse responder, minha mãe apareceu na porta. Ela olhou para mim, para o Falcão, e pareceu entender tudo em questão de segundos.

— Que confusão é essa? — A voz dela soou exasperada, e ela se colocou entre nós, como se quisesse evitar que aquilo explodisse mais do que já tinha explodido.

— Pergunta pra tua filha — Falcão disse, com um tom ácido. — Trouxe o namoradinho pro quarto e achou que isso aqui era festa.

— Mãe, ele tá exagerando! — gritei, a voz embargada de tanto chorar. — Ele entrou aqui sem nem bater! O Gabriel não fez nada de errado.

— Liliane, não vou discutir. — Falcão olhou para ela, e o tom na voz dele parecia uma ordem. — Eu já disse: aqui na minha casa, eu não vou permitir esse tipo de coisa.

— Falcão... — Minha mãe começou, num tom cansado, como se quisesse apaziguar a situação, mas ele levantou a mão, interrompendo-a.

— É minha casa. E as minhas regras são essas. Ponto final.

Minha mãe suspirou, olhando para mim com um olhar misto de preocupação e impotência. Ela sabia que discutir com ele não adiantava. Era isso que me deixava ainda mais furiosa: o poder que ele parecia ter sobre tudo.

— Pode deixar, eu resolvo com ela depois. — Ela passou a mão pelos cabelos, olhando para mim. — Mavi, a gente conversa mais tarde, tá?

Eu não respondi. Minha raiva estava borbulhando como uma panela prestes a explodir. Falcão me lançou mais um olhar, aquele mesmo olhar de sempre, cheio de autoridade, cheio de controle.

— E trate de se comportar, Maria Vitória. Não quero mais passar por isso. — Ele virou as costas e saiu, os passos dele ecoando no corredor.

Minha mãe hesitou por um segundo antes de sair também, fechando a porta atrás dela. Assim que fiquei sozinha, soltei um grito abafado no travesseiro, chutando as cobertas para o lado. As lágrimas continuavam caindo, mas agora era só de raiva. De vergonha. De impotência.

— Ele acha que é quem? — murmurei entre soluços, sentindo o coração martelar no peito.

Passei as mãos pelo rosto, respirando fundo, tentando me acalmar, mas era impossível. A imagem do Gabriel saindo quase correndo do quarto, o rosto do Falcão cheio de raiva, minha mãe impotente, tudo se repetia na minha cabeça como um filme.

Me joguei na cama, encarando o teto, enquanto as lágrimas escorriam devagar. Eu sabia que não tinha adiantado nada gritar, argumentar. Enquanto eu morasse naquela casa, as regras seriam dele. E isso me matava por dentro.

Fechei os olhos, mas o sono não veio. Tudo o que eu sentia era o peso daquela presença constante, sufocante, que parecia me seguir em todos os lugares. E agora, mais do que nunca, parecia impossível escapar dela.

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