capítulo 1

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{Cleópatra Nunes}

Nervosa. Era isso que eu estava quando pisei em solo espanholo ao lado da minha melhor amiga. Foi a idéia mais louca, mais séria e irresponsável que tivemos em toda nossa vida.

— sinto que vamos ser muito felizes aqui! — Athena olha ao redor animada.

— como vamos sobreviver sem ao menos saber um espanhol decente? — choramingo.

Antes de decidirmos fazer essa viagem, nós aprendemos o básico do espanhol, mas foi tipo... o básico do básico, do muito básico, o que eu só arrisco a pensar que não vai dar pra pronunciar quase nada de espanhol.

— isso é um pequeno detalhe Cleo, vamos conseguir. — a ruiva me puxa para podermos sair do aeroporto.

Avistamos vários táxis parados em frente ao aeroporto, a espera de clientes. Nos aproximamos de um desses carros, onde o motorista estava encostado no veículo. Pela nossa sorte, o homem falava português, e não precisamos nos humilhar tentando falar espanhol.

Entramos no carro após colocarmos as bagagens no porta malas, e o taxista deu partida no automóvel. O senhor já de meia idade, ia contando sobre lugares maravilhosos da cidade para Tete, nos informando até sobre lugares bons para visitarmos e que ficava próximo ao nosso novo bairro.

Pego meu celular, com o objetivo de conversar com algum de meus familiares. A bateria estava em 30%, era pouco, mas sei que duraria mais que o suficiente. Mando mensagem no grupo da família, avisando que cheguei bem, e que logo mais, estaria em minha nova casa.

Encosto a cabeça no vidro da janela, soltando um longo suspiro. Que saudade da minha casa, da minha mãe, do meu irmão, da minha sobrinha, da minha cunhada... que saudade da cidadezinha sem graça que eu morava...

Onde eu vim parar senhor?

muda essa cara de defunto menina. — recebo um tapa estalado em meus braços.

Reviro os olhos, e olho pela janela. Na rua, algumas pessoas andavam apressadas, outras iam devagar, apreciando o caminho. As ruas, casas, lojas, tudo eram nos mínimos detalhes, em cores vibrantes, chamativas, cheia de vida.

Impossível não lembrar de minhas roupas chamativas de quando eu era criança, me recordo de algumas ser cheias de glitter vermelho, de vários tons. Hoje posso dizer que eram roupas bregas, mas também posso afirmar que tinham personalidade própria.

Em meus lábios surge um pequeno sorriso com a lembrança, olho para o lado, vendo a ruiva tagarelar com o taxista.

Athena Sipriano é a minha melhor amiga dês de a infância, sempre fomos grudadas. No auge dos nossos 6 anos, que começamos a fazer diversos planos juntas, emprego dos sonhos, um marido perfeito, viagens...

Em nenhum desses planos incluia nós nos mudando para a capital da espanha. Mas também em nenhum desses planos incluia trabalhos desgastantes, relacionamentos tóxicos, esforços sem reconhecimento, e boatos inventados por toda a cidade.

Quando foi que nossas vidas viraram do avesso? Uma pergunta que me faz pensar no final do ensino médio, com toda a certeza foi lá que nossas vidas desandaram.

Com certeza tudo mudou quando saímos da escola, nos tornamos "adultas", assim... tudo tão de repente. E sem nenhum aviso, que nada seria igual a vida perfeita que havíamos planejado algum dia.

O percurso foi longo até pararmos em frente a uma pequena casa, com cores apagadas, tinta descascando, e algumas manchas do tempo, com uma grade e portão praticamente minúsculos, e enferrujados que um dia já foram na cor branco, as janelas estavam na mesma situação, e dava para ver que a quantidade de sujeira do lado de dentro daqueles vidros era enorme.

Sipriano pagou o motorista, e assim que entramos, levo um susto. Agora pude descobrir o porque minha amiga achou essa casa para comprar com um preço tão abaixo da média. Eu definitivamente não sou a mais fã de organizações, as vezes consigo até ser o terror das pessoas organizadas, mais o quão bagunçada e suja a casa estava, me surpreendeu.

— isso tá um lixão. — faço careta.

— talvez... — Athena cruza os braços, e eu a encaro. — tá... isso... tá um pouquinho... bagunçado, mais damos conta.

Athena sempre positiva, ou mentirosa, ai depende. Nesse caso, chuto que ela está sendo mentirosa.

— é só um pouquinho de sujeira Cleo. — me abraça por trás, me apertando. — podemos limpar isso, pintar tudo... podemos reformar, deixar com a nossa cara! — diz empolgada.

— e com qual dinheiro Tete? Temos que priorizar o básico agora, pelo menos até conseguirmos um emprego. — suspiro.

Minha amiga anda de um lado ao outro, provavelmente pensando em algo, em poucos minutos ela pega sua carteira, e sai avisando que compraria produtos de limpeza.

Andei por toda casa, era um tamanho bom, nem muito grande, nem muito pequeno, mas toda coberta por sujeira. Já estou tendo a certeza que essa casa foi abandonada por anos.

Eu já estava quase considerando me sentar naquele chão imundo, quando Athena voltou com diversas sacolas, rodo, pá, vassoura, e todos os produtos que existiam.

Começamos uma faxina pesada em todos os cômodos, tudo. Na minha mente só passava a música "levo vida de empreguete, acordo às sete".

Depois de limpar a casa toda, eu e Athena nos encontrávamos jogadas no piso da casa, que agora, tinha cheiro de desinfetante, e serena.

— Cleo. — a ruiva ergue a cabeça. — vai lá comprar algo pra gente comer.

— eu vou... mais você vem comigo né? — se fosse lá no Brasil, não teria problema em eu ir sozinha, mais eu estou aqui, em outro pais, sem nem saber falar espanhol direito.

—  você já tem 23 anos, sabe fazer as coisas sozinhas. — Athena se senta no chão. — não precisa de mim.

O pior de tudo, é que ela tem razão.

Suspiro derrotada.

Eu não gosto de falar com as pessoas, não sou boa em fazer amigos, odeio ficar muito perto das pessoas, não gosto de festas. Basicamente, não gosto muito das pessoas, e nem de sair sozinha.

— posso pelo menos tomar um banho antes?

— pode, mas nem pense em escapar. — diz enquanto se abana com a mão. — estou com calor, e com fome, então anda rápido.

Reviro os olhos sorrindo. Apesar de toda a situação, talvez não seja tão ruim assim, eu estou ao lado da minha melhor amiga, em outro pais. Podemos nos divertir né?

Após um tempo procurando por toalha e alguma roupa fresca, e decente, vou para o banheiro. Tomo um banho relaxante, eu realmente precisava disso.

Meu look é apenas um vestido florido simples, e como está calor, é super adequado.

Em silêncio, pego meu celular, e saio da casa em busca de algum lugar para comprar algo comivel por aqui.

Como será a comida daqui hein?

Olho aos arredores, caminhando calmamente pelas ruas, observando cada lugar, cada detalhe.

Com um pouco de dificuldade, eu finalmente entendo algo do cardápio da lanchonete em que entrei. Havia algumas opções meio esquisitas para mim, mais tudo certo.

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