Agradecer Ao Tempo

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**Melissa Narrando**

—Ah, meu Deus! Minha filha cresceu tanto! —minha mãe falou, enxugando lágrimas imaginárias e me oferecendo um abraço cheio de palavras não ditas.

Revirei os olhos, tentando inutilmente reprimir um sorriso de saudade.

—Chega de melação, dona Sophie! —pedi, retribuindo seu abraço de urso— Mas também estava com saudades, mãe. —admiti, tomando cuidado para não esbarrarmos nas malas ao meu lado.

Senti minha barriga roncar e me afastei lentamente, respirando fundo.

—Estou morrendo de fome. —comentei, fazendo careta quando ela riu.

—Não consegue ficar duas horas sem comer algo, não é? —ouvi alguém murmurar atrás de mim.

Franzi o cenho, notando o sorriso empolgado que minha mãe abriu e me virando para me deparar com um garoto 15 centímetros mais alto que eu.

—Sammy? —sussurrei, já sabendo a resposta e me jogando nos braços do meu irmão gêmeo.

Ele me apertou firme contra si, nos girando por um segundo e depositando um beijo casto em minha testa.

—Que saudades, pirralha... —disse, desviando o olhar para afastar as lágrimas e bagunçando meu cabelo. —A gente não se vê há tanto tempo que eu estava começando a desconfiar que você era pequenininha como na tela do computador. —brincou, sorrindo de lado e fazendo referência às nossas ligações por Skype.

—Só fazem 4 meses desde que vocês foram nos visitar na Inglaterra, não é possível que tenha esquecido o meu tamanho. —balancei a cabeça, me inclinando para pegar uma das malas enquanto ele fazia o mesmo. —Mas você cresceu uns bons 10 centímetros. —murmurei, começando a andar atrás de dona Sophie que, a essa altura, já ia em direção a uma das saídas do aeroporto.

O ar de Nova York me atingiu assim que as portas automáticas se abriram, revelando uma pequena multidão de pessoas indo e vindo de todas as direções. Desviamos dos corpos apressados à medida em que seguíamos rumo ao estacionamento do Aeroporto Internacional John F. Kennedy, chegando ao nosso destino poucos minutos depois e depositando as bagagens no porta-malas do carro da minha mãe.

20 minutos depois estávamos recolhendo nossos pedidos em uma lanchonete próxima ao nosso bairro e nos sentando em uma das poucas mesas vazias enquanto minha mãe tentava me atualizar dos acontecimentos.

—Como assim você está namorando, senhor Samuel Jackson Hayes? —perguntei, encarando meu irmão como se dona Sophie tivesse acabado de me contar que ele estava com lepra.

Não é que meu irmão não fosse o maior gato nem que eu seja ciumenta, é só que ele sempre foi muito na dele, vivia no canto e não chamava muito a atenção das garotas.

Aparentemente isso havia mudado.

—Pois é, minha filha! —minha mãe balançou as mãos, empolgada, colocando ketchup no hambúrguer que estava comendo. —Seu irmão virou o capitão do time de futebol da escola, também. —adicionou, ignorando os protestos do filho. —Ele tenta ser modesto, mas sei que faz sucesso por lá, principalmente com as gatinhas... Você não sabe o que perdeu.—afirmou, cutucando um dos meus braços como se a parte a seguir fosse a mais importante. —E eu acho que você vai adorar, pense em quantos amigos gatinhos do seu irmão vão lá em casa.

Corei, fingindo me concentrar nas batatas fritas à minha frente.

"Não é como se algum deles fosse dar bola pra mim, mãe" pensei.

Ignorei o momento de baixa autoestima.

—E você esqueceu de me contar essas coisas quando conversava comigo? —fuzilei-o com o olhar.

—Eu não esqueci, eu só preferi ocultar... —Samuel revirou os olhos, querendo urgentemente mudar o foco do assunto e me olhando em seguida. —Mas bem que a gente podia falar um pouco da mudança da Mel, né? Sem ofensas, mas você era meio esquisita... Principalmente quando nos falamos pela última vez. —roubou uma batata minha.

Fitei-o.

—A gente se falou ontem por chamada de vídeo. —lembrei.

Ele sorriu, assentindo.

—Eu sei. —respondeu, mordendo-a.

Arqueei ambas as sobrancelhas no momento em que minha mãe empurrou levemente o ombro dele, tentando segurar o riso.

—Obrigada pela parte que me toca, Samuel. —falei, pondo a mão no peito dramaticamente e desembrulhando meu hambúrguer.

—Sua irmã sempre foi a menina mais linda do mundo. —nossa progenitora me defendeu, em tom de sermão, começando a comer.

Samuel encarou-a, franzindo o cenho e se esforçando para não rir.

—Também não vamos exagerar, certo? —pediu, brincando e piscando inocentemente quando revirei os olhos. —Você tem que agradecer ao tempo? Tem, mas você é, mesmo, linda, nunca duvide disso. —falou, tomando um gole do seu milkshake em seguida.

Balancei a cabeça, aceitando o elogio e agradecendo com o olhar.

Não, não, não era como se eu tivesse me transformado em uma modelo, galera, não precisa dessa empolgação toda.

—Eu não mudei tanto assim... —encarei o hambúrguer. —Pelo menos não por dentro, acho. —Dei de ombros, mordendo um pedaço.

Sofri bullying por algum tempo por ser considerada diferente do resto das garotas da minha idade quando era criança porque, em algum ponto da minha vida, as pessoas decidiram que não era aceitável se vestir do modo que eu me vestia ou ter a quantidade de espinhas que ganhei durante a puberdade.

Fui para Londres morar com meu pai, Rafael, aos 12 anos, em parte fugindo de tudo aquilo que me fazia mal e tentando descobrir quem, por fim, eu era. Felizmente, no entanto, acabei notando que não valia a pena mudar por pessoas que nem sequer se importavam comigo

A mudança de pensamento e a confiança em mim mesma acabaram fazendo o resto do trabalho.

(***+***)

—Lar, doce lar! —gritei ao chegar em casa, girando no lugar e respirando fundo. —Eu só quero a minha cama. —murmurei para ninguém em especial, cansada.

—Pode ir, meu amor, seu irmão leva a outra mala mais tarde. —minha mãe disse, dando dois tapinhas no braço de Samuel e me mandando um beijo.

Ri quando ele fez careta.

—Claro, o mordomo aqui faz tudo. —brincou quando comecei a subir as escadas, já levando uma das bagagens e indo em direção à porta que pertencia ao meu antigo quarto.

Ao entrar no cômodo, observo com atenção a nova decoração que minha mãe fez para minha volta.

Uma das paredes era em um tom azul extremamente claro e nela haviam polaroids minhas formando um mural em formato de coração. Nessa mesma parede havia uma bela escrivaninha branca com um notebook, uma impressora e alguns livros em cima, da escola, suponho.

Notei duas portas dentro do quarto, a do closet e a do banheiro, pelo que vi. Minha cama era de casal e estava encostada na parede em frente à azul, coberta por travesseiros muito confortáveis nos quais me deitei e logo adormeci, pensando em como seria meu retorno à escola.

**************

Resolvi reeditar esse livro que leva uma parte enorme do meu coração e fiquei extremamente orgulhosa da Lisane de 13 anos pelo que ela criou, gente, socorro.

Esse capítulo em especial era algo que eu estava precisando muito rever. Como início de tudo e minha primeira experiência de escrita, ele não tinha muita coisa a ver com o lugar em que a história se passa nem a idade dos personagens, então espero que gostem dessa nova edição do livro, sério ❤️

Beijocas,
Lica.

O Meu Melhor (EM REVISÃO)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora