CONTO 2
Abraçada com as próprias pernas no chão do banheiro, Margot praticou o exercício de autocontrole pela sétima vez, fechando e abrindo os olhos, inspirando fundo e exalando devagar, a fim de neutralizar o surto de emoções que a desmoronou como uma cascata à deriva.
Quando apertou o contato da prima no celular e aguardou pela ligação, engoliu o choro o melhor que pôde, arranhado o chão para não arrancar os próprios cabelos.
— Margot? Oooiii, eu estava prestes a te mandar uma mensagem, queria saber o que acha de…
— Daisy. — Sua voz era gélida, cortou o bom humor da prima como lâmina, que prontamente se calou. — Eu preciso que você venha aqui em casa. Agora. — Notou que as mãos suavam, mas limpar as palmas na calça não apaziguou a tremedeira. — Por favor.
Daisy não questionou, sabia que Margot notoriamente necessitava de companhia, seja lá o que causou aquela angústia e urgência em sua voz. Imediatamente, se viu preparada para lidar com o urso cretino de três metros devorador de mulheres indefesas que poderia ter desesperado sua prima, mesmo que tudo que pudesse oferecer fosse uma frigideira e uma armadura de coragem inimiga do capacitismo patriarcal. Sempre soube que não era uma boa ideia aquela localização que o marido de Margot escolheu para que os dois morassem… Agora era a hora de provar que estava certa sobre aquele matagal.
Ela só havia se esquecido de que não existem ursos em habitat natural na Inglaterra.
— Chego aí em cinco minutos! Fique calma! Tire as roupas e jogue no quintal para criar uma distração, se esconda embaixo da cama e fique em completo silêncio. Se finja de morta. Nem um piu. Serei rápida!
Margot sentia o corpo tremer num instante, no outro, franziu as sobrancelhas em confusão. Mas conseguiu dizer que amava a prima, em agradecimento. De fato, a mulher era um anjo em sua vida. Mesmo que não batesse bem da cabeça às vezes.
Daisy chegou quebrando tudo pela porta dos fundos 5 minutos depois.
— Cadê ele?! Hein?! Apareça e vê se briga com alguém do seu tamanho, seu cretino de meeeeerda!!
Margot arqueou a sobrancelha para a mulher valente numa posição de ataque com seu pijama branco de estampa dos ursinhos carinhosos, um coque bagunçado no topo da cabeça e uma frigideira de porcelana nos punhos. Os olhos azuis implacáveis buscavam pela ameaça por todos os lados, como uma águia.
A bombinha de leite zumbia abaixo da blusa do pijama, e por um momento Margot quis rir da situação de Daisy, até que isto imediatamente a retornou ao estado depressivo.
— Ele quem? — Mesmo assim, quis saber, desentendida.
— O urso! O serial killer! Sei lá, quem te fez chorar?! — Lentamente, Daisy foi desfazendo seu modo ninja e abaixando sua defesa. Apoiou a frigideira na bancada da cozinha com uma agressividade não proposital, e Margot conseguiu rir, apesar do desastre da situação.
— Não há nenhum invasor. Por favor, não prejudique sua frigideira nova. — Ela começou o trajeto em direção ao segundo andar, a cabeça baixa, derrotada. — Suba comigo.
Daisy a acompanhou, intrigada. No quarto do casal, Margot foi-se direcionando para o banheiro e retornou com algo em mãos. Sentadas na cama, entregou os objetos à sua prima e prestou atenção no tapete, sem coragem de encará-la.
Primeiro, Daisy não entendeu exatamente que emoção devia transparecer. Foi sorrindo, os dedos dos pés se contorcendo, e de repente engoliu a comemoração, analisando melhor a melancolia no rosto de Margot. A melhor alternativa foi abraçá-la de modo reconfortante, massageando suas costas conforme sussurrava:

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O Mar & A Rocha (MI).
Short StoryNesta curta trama procedente da história "Missão Impossível", a vida pós-final da Grande Guerra na nova realidade dos personagens é narrada sob uma perspectiva autêntica e realista em seu modo mais humano, escrita em pequenos contos que relatam as m...