— Você me disse que isso poderia interferir no efeito do remédio para a infertilidade — explico novamente, ainda sem mover o corpo. Meus olhos ainda estão de encontro às árvores, mas eu não as olho. É uma visão sem conexão, diria que apenas o meu rosto está virado para a região. Me submeto-me a isso porque não quero encará-lo, não quero olhar para o homem que apunhala meu coração e rasga minha carne. Que me faz querer descer e desabafar com as lamparinas. — Eu ainda quero ser a mulher que vai lhe dar um herdeiro, Edward, por mais que isso custe um pouco da minha felicidade momentânea.

— Eu sei, Morgana, sei de todos os seus desejos, minha querida. — Ele mente, mais para si mesmo do que para mim. É engraçado pensar que o homem acha estar me enganando. Edward deposita dois dos seus dedos no meu ombro nu, como uma tentativa de consolo pelas palavras ríspidas e afiadas que havia soltado horas atrás. — Mas sua família pode querer que eu lhe leve, não acha?

Sua família, ele disse Não ele, nunca seria ele, mas sim a minha família que me quer lá. São essas as palavras que saem como súplicas internas completamente desorientadas. Confusas. Palavras intrínsecas ao seu peito, enquanto ele respira o ar puramente livre, coisa que o homem considera diferente de si mesmo. Nunca entendi o porquê, nunca o prendi. A única, literalmente, a única coisa que fiz nos últimos anos da minha vida foi amá-lo. Meu campo de visão se distancia da magnífica paisagem que eu tenho das copas das árvores esbranquiçadas pela neve e se direciona ao homem de olhos verde-musgo. Um verde tão perfeitamente encantador que, logo no começo do nosso relacionamento, me fazia delirar. Hoje já não sei a sensação que causa em mim.

É algo tão monótono vislumbrar sua íris verde estampada de ódio e exaustão, como se não me desejasse com ele, como se me desprezasse por continuar viva. O jeito que o portador de fios negros está me olhando me faz querer descer e conversar com as lamparinas de novo, é a terceira vez que ele faz isso comigo só neste dia. Terceira vez que eu sinto esse sabor amargo e enferrujado na boca, terceira vez que sinto as lágrimas querendo escapar dos olhos, terceira vez que sinto essa dor insuportável que se instala no meu peito. Terceira vez que penso que os olhos dele poderiam estar certos.

— Aliás, é uma comemoração de grande importância para nossas famílias, não acha? — Pisco, frugal. E ele complementa sua fala me fazendo uma pergunta que claramente nós dois já sabemos a resposta. Seus olhos pálidos encaram os meus, criando um conflito entre duas grandezas glaciais e inimigas. — Acho que eles ficariam felizes em lhe encontrar mais vezes. Por mais que seu pai tenha feito o que fez com a monarquia, ele morreu há quase dez anos, não acredito que guardem rancor.

Eu não quero pensar nisso. Eu não quero pensar. O amplo e cotidiano conflito é estilhaçado quando ele tira seus dedos frios do meu ombro exposto e os coloca no bolso macio de seu casaco peludo. Com sua atitude repentina, bruta e totalmente inesperada, meus cílios inferiores se chocam com os superiores e, pouco tempo depois, se distanciam com calma um do outro, escondendo a sensação alarmada que ele causa em mim.

— O que eu acabei de dizer não vai ser retirado, Edward. Por favor, não insista nesse assunto. — Facas estranhamente aguçadas. É assim que eu classificaria as palavras que direcionei a ele. Afiadas como facas recém-amoladas em pedras marinhas extraídas do fundo do meu mar. — Eu vou ficar, e essa é a minha escolha. — Engulo em seco após sussurrar, reprimindo as bochechas. Mesmo que eu não demonstrasse ao homem que considero o meu marido, fiquei triste por não poder ir à grande festa. É absurdamente mais importante para minha família paterna, mas também para mim, ainda que eu guarde tristeza por não comparecer. — Depois eu me resolvo com minha família, meu amor. De qualquer forma, obrigada por se preocupar com meus relacionamentos.

Meu amor.

É bastante estranho chamá-lo assim depois da briga que tivemos hoje mais cedo, quando o dia estava nublado e o tempo não estava tão frio, mas, sim, ameno, até um pouco quente. A discussão foi à tarde, mais ou menos quinze minutos depois de uma calma e saborosa refeição diária. Terminei de comer, limpei minha boca com o guardanapo que sempre ficava à esquerda dos talheres, que antes estavam limpos. e sorri para ele. Encarei-o, com olhos pidões e ele assentiu, me dando permissão para falar. Abri a boca e comecei a comentar sobre as coisas simples, mas profundamente importantes, que me aconteceram no meu dia ou no meu mês e, enquanto conversávamos, o homem tocou no assunto. Edward tem consciência de que isso me machucava. Discordei, ele se alterou, jogou o guardanapo em cima da mesa e saiu da sala, me deixando sozinha. E assim brigamos mais uma vez.

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⏰ Last updated: Feb 23 ⏰

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