20. Uma amaldiçoada

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Aterrorizada, me encolhi na cadeira, erguendo os braços para proteger minha cabeça. Meus olhos se encheram de lágrimas, e os olhares intensos daquelas pessoas eram dolorosos demais. A pressão sobre mim tornava-se quase insuportável. Sentia um impulso de gritar e fugir da sala; parecia que todos ali me julgavam culpada de alguma forma.

— CONDE XAVIER! – A voz do Rei ecoa alta e imponente, silenciando o homem e todos na sala. — Permiti sua presença aqui, pois estava compadecido por sua perda, mas não tolerarei tal comportamento! Se se exaltar novamente, será expulso da sala.

Horas se arrastaram durante aquele interrogatório incessante. Tentaram extrair cada fragmento de memória que eu pudesse possuir, mas sem sucesso. Minhas recordações se limitavam ao instante em que adentrava o bosque, à visão de Rayon apoiado em uma árvore sobre uma poça de sangue seco, e à imagem de Alice sendo consumida por slimes.

Incapaz de recordar mais qualquer detalhe e sem respostas para as inúmeras perguntas, fui encaminhada a um aposento no castelo, onde magos e cientistas realizavam testes e análises diárias. Para a decepção geral, nada em meu corpo indicava anormalidades. A única peculiaridade era minha completa ausência de memória.

Permaneci semanas confinada no quarto, sem permissão para sair. Gian, em seus visitas diárias, era a única pessoa autorizada a entrar, além dos magos e cientistas que conduziam suas análises. Durante uma dessas visitas, ele compartilhou que o Capitão Cleones tentou regressar ao saber do ocorrido, mas circunstâncias específicas o impediram de retornar.

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Dois meses se passaram, e eu ainda permanecia confinada. Embora agora me permitissem pequenos passeios pelos corredores do palácio, a saída para o exterior continuava proibida. Os servos me dirigiam olhares apreensivos, carregados de medo. A frequência dos testes diminuíra, mas minha memória ainda não havia retornado.

Sinto-me solitária e desorientada. Gian não me visita com a mesma frequência; já se passaram duas semanas desde a última vez que o vi. Ouvi os criados comentando que o filho do Duque Cleones havia partido para outro país como parte de seu intercâmbio.

A ausência de uma despedida de Xion me causou uma tristeza imensa, sentindo-me traída e abandonada. Passaram-se seis longos meses até que finalmente perceberam que não conseguiriam obter informações cruciais por meio de mim. Fui convocada novamente pelo Rei.

— Senhoria Sant, você permaneceu confinada no palácio durante todo esse tempo e sempre esteve disposta a colaborar com os testes e investigações. No entanto, não conseguimos encontrar nenhum vestígio em suas memórias. Acreditamos que isso se deve às experiências traumáticas repetidas que você vivenciou. Por essa razão, tomei a decisão de permitir que retorne à sua residência e ao campo de treinamento!

Após as palavras do Rei, uma comoção tomou conta dos nobres presentes na reunião.

— Vossa Majestade, acreditamos que não é apropriado que essa jovem ande livremente. Ela é vista por todos como símbolo de catástrofe. – pronunciou o Conde Xavier. 

— Isso é absurdo! Como uma criança pode ser responsável por tais desastres? – defendeu Gian.

 — Não é que ela seja culpada. No entanto, sua simples presença evoca sensações e memórias ruins para todos aqui.

— Vocês devem estar brincando. Se for assim, a presença de cada um aqui causaria algum tipo de desconforto. Todos nós passamos por situações desagradáveis, e ainda assim, não associamos a imagem de nenhum de vocês a esses acontecimentos! – pronunciou o Conde Leon, assistente direto do Rei, defendendo minha causa e surpreendendo a todos na sala, silenciando-os.

— Está decidido, ela retomará sua rotina. Não quero mais ninguém discutindo esse assunto. E considero encerrada esta audiência! – anunciou o Rei, levantando-se e dando o veredicto final.

Após a audiência, retornei ao quarto onde estava hospedada, carregando apenas a bolsa repleta de cristais de monstros. Ao segurar aquela bolsa, uma onda de emoções tocou meu coração, indicando que aquilo não era uma lembrança agradável. Mesmo assim, decidi levá-la para fora do Palácio.

"Pretendo nunca mais colocar os pés nesse lugar!" – refleti comigo mesma ao sair da imponente construção. Gian me deixou na porta de casa e se despediu, deixando-me com uma sensação de perda.

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— Gian, posicione guardas disfarçados ao redor daquela jovem. Não permita que nada prejudicial aconteça a ela. Estou ciente de que algumas pessoas estão descontentes com minha decisão e podem tentar algo contra sua vida. No entanto, assegure-se de que ela não tenha conhecimento de que está sendo protegida por mim. Quero que essa pobre criança tenha uma vida o mais normal possível, dentro do que for possível. — ordenou o Rei a Gian em segredo. 

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Os dias transcorreram tranquilamente após minha libertação do Castelo. Alguns guardas ainda asseguram minha proteção durante a noite, a pedido de Gian. No entanto, Gian nunca mais pôde me visitar. As pessoas continuam me olhando com indiferença ou medo. Algumas crianças, ao me avistarem, chegam a lançar pedras em minha direção. Fui forçada a permanecer reclusa em casa, pois os rumores que se espalharam pela cidade afirmam que a garota da vila Libã está amaldiçoada, e desastres ocorreriam por onde ela passasse.

As Crônicas De Elena - e o Passado Esquecido!Where stories live. Discover now