01 | olhos azuis

7.4K 346 170
                                    

Eu costumava sonhar alto, até que muitos desses sonhos foram destruídos. Curioso para saber como? Deixa eu te contar: não foi um namorado que terminou comigo; ou porque quebrei uma unha; muito menos porque meu vestido não combinou com um sapato em tal ocasião. Bem que eu queria que meus maiores problemas fossem desse grau.

Tudo começou quando meus pais se separaram, eu tinha apenas 5 anos na época – pode ter sido uma merda para apenas uma criança entender o porquê daquilo estar acontecendo, mas agora eu entendo que minha mãe só queria ter uma vida normal. Meu pai costumava bater muito em minha mãe, e às vezes, até mesmo em mim. Ele colocava a culpa no álcool que não conseguia largar, mas que, para minha sorte, diminuíram com o tempo, bem longe do Brasil e da minha mãe.

Minha guarda ficou com meu pai e precisei conviver com ele por alguns anos. Veja bem, ele tinha uma ótima estrutura financeira para cuidar de uma criança, já minha mãe apenas ganhava o necessário para se manter viva. Era lógico com quem o juiz iria deixar a minha guarda.

Entretanto, uma luz no fim do túnel apareceu. Por conta do seu trabalho, meu pai me mandou de volta para o Brasil, onde voltaria a morar com minha mãe. Eu estava tão feliz que mal parava no lugar, sentia falta de tudo no Rio Grande do Sul e principalmente da minha mamãe!

Bom, depois de toda a choradeira do reencontro no aeroporto, mãe e filha voltaram para casa animadas, colocando o papo em dia no carro. Também apreciei os momentos que olhei pela janela do carro e vi como minha cidade natal estava diferente e fofa.

Após arrumar as malas e de um bom banho, decidi que daria uma volta por aí. Queria observar melhor o bairro.

— Mãe, vou dar uma volta! — gritei, pegando meu moletom sobre o sofá e correndo até a porta. Ela gritou de volta perguntando para onde eu ia. — Não se preocupe, volto antes do jantar!

No fim, acabei apenas dando voltas pelas ruas. Sem um rumo aparente, só observando tudo. Eu queria ver algo novo, sentir o que esqueci, e poder voltar a ser eu mesma.

Depois de andar por um certo tempo, olhei pela vitrine de uma loja e li: "Leve três barras de chocolate e pague o preço de uma!" e as letrinhas miúdas abaixo do anúncio foi o impulso de me lançar para dentro da loja, escrito em negrito um "Tempo limitado". Agradeci aos céus por ter trazido dinheiro comigo.

Corri para a prateleira mais próxima e peguei três chocolates de sabores diferentes. Enquanto me dirigia ao caixa, notei que havia um cara encapuzado a minha frente, até aí tudo bem, nada de diferente. Mas, bem ao seu lado havia outro garoto, e esse era alto e de cabelos morenos... Meu Deus! Eu quase não o reconheci sem os enormes fones de ouvido que costuma usar em vídeo.

— Alan? — chamei-o, me aproximando dele e tentando manter a calma.

Ele se virou em minha direção e instantaneamente abriu um sorriso.

— Opa! — disse. — Eaê, tranquilo?

— Meu deus, eu quase não te reconheci! Você fica outra pessoa sem o headset!

— Ah, essa não, até você?! — brincou e olhou para a pessoa ao seu lado, sorrindo. — Parece que você não é o único que pensa assim, tapadão.

O garoto olhou para mim pela primeira vez. Ele parecia tão sombrio naquele capuz preto que eu só pude ver seus olhos me fitando. Não era um azul forte, mas sim intenso. Mesmo assim, foi capaz de fazer as batidas do meu coração ficarem descompensadas.

— Qual é, cara, quer dar uma de assassin's creed? Tira logo esse capuz. — Alan comentou e puxou de uma vez o capuz do garoto, revelando enfim quem era.

❝Say Something❞ cell.bit Onde as histórias ganham vida. Descobre agora