Dia 05

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Johannesburg – 07:30 am 

Iori Sow acabara de chegar ao prédio onde trabalhava. Olhou para o relógio e viu que ainda faltavam trinta minutos para as oito, quando o expediente da revista deveria, de fato, começar. Ela não se importava de chegar mais cedo, na verdade, fazia questão. Como em todas as manhãs, pegou seu café e começou a beberica-lo, enquanto observava Joanesburgo pela grande janela envidraçada do escritório. Uma bela vista de uma grande cidade, sem dúvida.

Ela lutara para chegar ao posto de editora-chefe, mostrara seu talento, fizera hora extra, dera as melhores ideias, passara noites em claro até que, enfim, fora reconhecida e recebera aquele cargo. Era uma jornada puxada, sem dúvida, mas estava disposta a fazer da sua revista, a maior revista de moda da África do Sul.

Um beija-flor azulado surgiu de repente, batendo suas asas contra o vidro. Iori pulou da cadeira e abriu a janela, antes que ele se machucasse. Não sabia que eles voavam tão alto. Ele rodeava Iori, que se perguntou se seu perfume o estaria deixando confuso. Pairou diante dos olhos dela, que começou a sentir um aperto no peito, levemente asfixiante. Tentou caminhar para o sofá, mas tropeçou e caiu no chão. Rastejou em direção a bolsa, tencionando pegar o celular e chamar uma ambulância, a sensação asfixiante parecendo maior, como se não conseguisse nenhum oxigênio do ar. Lembrou-se de uma vez, fazendo hiking com uma amiga, como ela lhe dissera que o ar no topo das montanhas era... rarefeito?

Sua cabeça estava ficando confusa, alguns pensamentos não faziam sentido. Ela finalmente alcançou a bolsa e pegou o celular. Ficou alguns minutos com o aparelho na mão, tossindo, e tentando se lembrar como destrava-lo. Uma mão feminina pegou-o e ela olhou para cima, para ver quem era. Viu a si mesma, sorrindo e segurando o celular. Seu cérebro não podia mais com tão pouco oxigênio e ela desmaiou.

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 Enseada, arredores de Sidney – 05:00 pm 

— Vamos, Darri, entra na água! — Lowan gritou, pela terceira vez.

— Não, eu tô bem aqui no seco, obrigada! — ela repetiu a resposta, pela terceira vez.

A verdade era que Darri não sabia nadar. E eles estavam muito longe, jogando bola e subindo nos ombros uns dos outros. Quer dizer, Christine estava subindo no ombro do Eithan, o que Darri considerava uma falta de respeito, particularmente. Tudo bem que ela acabara de ser transferida, e que Christine a introduzira em sua turma, mas já havia comentado como achava Eithan bonito e, desde então, a “amiga” parecia fazer de tudo para estar sempre tocando ele, mostrando-se para ele. Esta visita à enseada, inclusive, havia sido ideia dela, para estrear seu novo biquíni minúsculo e indecente.

Darri sacudiu a cabeça. Devia parar de ver maldade em Christine, dessa forma. Afinal, ela é que acabara de chegar, nem sabia direito que relacionamento eles tinham. Podia ser que sempre fossem muito íntimos. De qualquer forma, ela não queria ter que admitir que não sabia nadar. Era vergonhoso demais morar em um lugar como aquele, com todo o mar brilhando azul e não saber nadar. Pior ainda para a vida social de uma garota de quinze anos.

Ela observava de longe os mergulhos deles e a algazarra que faziam. Demorou um pouco para perceber o que estava acontecendo. Foi só quando o crocodilo ergueu Christine uns dois metros acima da água, que ela se levantou e começou a gritar.

O bicho enorme mergulhou outra vez, carregando Christine com ele e Darri não conseguia ver os outros dois. Ela pegou o celular e discou o número de emergência, gritando o nome da enseada onde estavam e que havia um acidente com crocodilo, para eles virem depressa. Desligou o telefone e puxava os cabelos, desesperada. Não percebeu que fazia um barulho constante, como um soluço alto e agudo demais.

Correu em direção à beira da estrada, pensando que poderia haver alguém ali para salva-los. Não queria acreditar que estavam mortos, não podia ser. Seus pés sangravam por estar pisando descalça nas pedras e ela nem se dava conta da dor, nem mesmo quando chegou ao asfalto quente. A enseada ficava afastada da cidade e achar um carro ali seria um golpe de sorte. Desistiu e correu de volta para a beira, mas não havia qualquer movimento diferente na água, tudo parecia normal. Exceto que seus amigos haviam sumido.

Sentou-se no chão e escondeu o rosto nas mãos, chorando. De repente se deu conta de que o crocodilo poderia sair da água e vir atrás dela e levantou a cabeça rapidamente. Seus olhos se arregalaram e ela abriu a boca buscando um grito que não conseguia sair, porque o choque que ela sentia paralisara todo o fluxo de energia do seu corpo.

Eithan saía da água, usando seu calção vermelho e a corrente de ouro que sempre o acompanhava. Poderia se dizer que ele caminhava tranquilamente, como se nada houvesse acontecido. Exceto que a cabeça dele era uma deformidade enorme, reptiliana, torcendo os ossos e moldando a pele, como num daqueles efeitos de filme, quando alguém se metamorfoseia. Ela parecia estar se ajustando para se tornar a cabeça normal de Eithan.  Estava mais perto disso agora, enquanto se aproximava de Darri, e ela viu que um dos olhos era quase do tamanho de uma bola de tênis vermelha olhando para ela, que finalmente achou o seu grito e emitiu uma nota aguda.

 Um carro passava na estrada. O motorista ouviu o som agudo do grito, mas ele estava distante e foi cortado tão repentinamente, que ele achou que havia sido só impressão e seguiu caminho.

A InvasãoWhere stories live. Discover now