Distrito Deuteronômio, 2437 d.C.
ÁRTICO
Acordo com um estardalhaço de madeira, um impacto me joga para frente e sinto meu rosto encontrar uma superfície de couro. Eu ainda estou processando o cenário atual, quando recordo quais as circunstâncias me colocaram inconsciente. Sinto um puxão nos meus ombros me colocarem de volta no banco, as mãos que fazem o movimento são calejadas e estão amarradas.
— Você está bem, Ártico? – Isaac me pergunta, vejo que minhas mãos também estão presas.
— Porra! – É tudo que consigo dizer, ainda estou tonto e antes de encontrar o banco da frente, minha cabeça bateu na janela ao lado.
— Você está bem, Ártico? – ele pergunta mais uma vez, ordenando uma resposta no tom firme.
— Estou... O que está acontecendo?
Demoro um pouco, mas enfim consigo me localizar. Estou no Opala de Isaac, o transporte de fuga para o caso de alguém nos encontrar, o que é irônico já que a cor do carro pode ser considerada um chamariz de atenção. Com um pouco mais de observação, descubro que estamos dentro do galpão de Krevos, ou o que ele costumava ser, já que a grande quantidade de madeira destruída demonstra a ausência da porta.
— Saia – Isaac abre a porta do meu lado. – Para fora – ele começa a ficar impaciente com a minha letargia.
Ponho-me para fora do automóvel, vislumbrando de esguelha que a porta da frente também está aberta. As amarras nos meus pulsos foram muito bem feitas, estão quase impedindo minha circulação.
Enquanto tropeço no entulho, eu vejo o demônio que me deixou inconsciente. Todavia não é a coisa que prende minha atenção, mas Krevos como refém de um outro demônio. Meu amigo parece prestes a desmaiar, a palidez dele é alarmante.
— O Arcano – o novo demônio sorri ao me ver, mostrando uma fileira de dentes apodrecidos que contrasta com a pele desbotada.
— Vou perguntar de novo, – é a aberração que aparentemente trabalha para Igreja quem fala – quem é seu chefe?
Krevos pede socorro com os olhos, lágrimas gordas escorrem em seu rosto sardento. Meu coração palpita contra as costelas, preciso fazer algo.
— Venha – Isaac demanda perto do meu ouvido.
Ele quer fugir, mas eu não posso fazer isso. Não posso deixar Krevos entre duas figuras infernais à própria sorte, ainda que há horas – pelo menos eu suponho que tenham se passado horas desde que comecei a dormir –, ele tenha me abandonado e se escondido debaixo de uma mesa.
— Não – eu devolvo, vendo a mandíbula do meu mentor se travar.
— Ainda estou esperando você responder – a coisa de pele vermelha enuncia inflexível.
O outro demônio solta uma gargalhada, deixando os múltiplos e curtos chifres dele se erguerem para o alto.
— Escrava da Igreja – o demônio pálido cospe perto dos pés dela, apertando ainda mais a mão em volta do pescoço de Krevos. – Meu chefe logo estará aqui e matará o Arcano – um fio gosmento da boca dele mancha a testa do meu amigo.
Dou dois passos para frente, Isaac me impede de continuar.
— Ela cuidará disso – ele me comunica.
Eu não acredito em tal coisa, o demônio de pele vermelha deixou claro que veio aqui me capturar, não existem razões para que ela salve Krevos. Vejo o peito dela subir e descer numa respiração pesada, ela flexiona o pescoço e se concentra.
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Infernal
HorrorO Apocalipse chegou. A mulher vestida do sol apareceu no céu, junto de um dragão e ao som das sete trombetas que trouxeram pragas, dizimando um terço da população. Os portões do inferno foram abertos, deixando passar legiões de demônios, que agora a...