Capítulo Onze

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As ruas estavam lotadas, e era difícil andar rapidamente em meio à toda aquela correria de pessoas apressadas. Por sorte, a última coisa que Emma queria era caminhar rápido. Ela queria aproveitar cada segundo desse dia. Havia decidido que depois de hoje ela se dedicaria totalmente a trazer seu pai para casa, por isso precisava se lembrar do sol, da brisa, das flores e de tudo que pudesse, absorver cada detalhe daquela paisagem, já que passaria muito tempo longe de seu ritmo atual, e portanto não teria muitos passeios como esse.

Isaac não conseguia tirar os olhos da menina que andava à sua frente. Ela parecia brilhar, com uma felicidade genuína que ele nunca tinha visto estampada no rosto dela. Nos lábios, ela trazia o sorriso mais lindo que ele já vira. E era impossível não notar o encantamento nos olhos dela, como se tudo ali fosse novo e revigorante para Emma. Ele queria guardar aquela imagem para sempre em sua mente. Ela estava tão bonita, com o cabelo voando ao vento, as mãos abertas, ao lado do corpo, as pernas se movimentando elegantemente, as sobrancelhas levemente erguidas, a boca curvada num sorriso de triunfo por estar finalmente livre das quatro paredes em que havia ficado presa até então. Era como se ela voasse pelas ruas, a cada esquina parando para admirar uma nova flor, ou então cumprimentar um cãozinho que passava por ali. Ele nunca vira tanta inocência numa só pessoa, e aquilo o fascinava. Emma era uma caixinha de surpresas para ele, e Isaac nunca se cansava de desvendá-la.

Foi então que o garoto percebeu que estava tão concentrado nos seus pensamentos que não havia percebido Emma correr até a ponte mais próxima, e inclinar-se para ver o rio lá embaixo, com suas águas cristalinas passando lentamente por debaixo de onde ela estava. 

Um súbito vento correu por entre as árvores, um vento que nunca era bom sinal. Isaac apressou-se para o lado de Emma, mas era tarde. Ele estava movendo-se bem atrás dela, o espectro maligno que só ele via. O garoto sabia que precisava salvá-la, e aquilo só atrasava ainda mais seus passos, que agora eram quase uma correria. Ele não podia fazer grande barulho, para não assustar a sombra que tentava alcançar Emma, mas também não podia deixá-la chegar ao seu objetivo.

Uma olhada para trás foi o suficiente para que ela se aproximasse de Emma mais do que ele gostaria. E então aconteceu. A sombra moveu seus braços para frente, e empurrou as costas da garota, que estava debruçada sobre as bordas da ponte. Como se num passe de mágica, ele viu Emma subir para cima, e depois cair violentamente, como se algo a estivesse puxando para baixo. O mundo ao seu redor ficou mudo, e ele só conseguia ouvir os gritos aterrorizados da garota, que logo soaram muito longe dali.

Sem saber o que fazer, Isaac correu o mais rápido que podia, parando somente quando chegou na beirada da ponte. O tempo passava mais devagar agora, e a queda de Emma parecia adiada. Incrivelmente, as pessoas haviam sumido de vista, e ele não podia pedir ajuda a ninguém. Sem outra alternativa, e desesperado com a perspectiva de Emma caindo na água lá embaixo, e se debatendo para resistir ao afogamento, ele fez a única coisa em que conseguiu pensar. Pulou para cima da ponte, e se jogou sem olhar para trás.

Emma revirava os braços, de um modo completamente inútil, como se quisesse levantar voo. A queda parecia longa para ela, e para sua sorte o fundo ainda muito abaixo. O ar inundava suas narinas mais rápido do que ela conseguia processar, e logo ela estava respirando com dificuldade. Seu corpo ficou leve, e ela fechou os olhos ao se ver mais próxima da água. Em poucos segundos ela atingiria o rio, e sem saber nadar ela não teria a menor chance de salvar-se.

Foi nesse instante que ela sentiu mãos quentes a segurando pela cintura, trazendo-a para cima no momento em que seus dedos tocaram a água gelada bem abaixo de si. O vento batia em seu rosto, mas ela ainda não havia reunido coragem suficiente para abrir os olhos. Por um segundo ela pensou ser impressão, mas ela se sentia levantando acima do ar a sua volta. Como se estivesse voando. Era loucura, ela sabia, mas não pode resistir à tentação de confirmar. 

Então, com um esforço sobre humano, ela empurrou suas pálpebras para cima, e avistou a céu azul bem acima da sua cabeça, perto o bastante para fazê-la sentir que, se estendesse a mão, conseguiria tocá-lo. Ela ouviu um sussurro incompreensível ao seu ouvido, o que a fez virar a cabeça para trás e conferir de onde vinha aquela voz.

Ela não conseguia acreditar no que seus olhos viam, e por um pequeno minuto pensou estar sonhando. Estava nos braços de Isaac, e eles estavam literalmente voando. Não podia ser real, não tinha como ser. E como se não bastasse havia algo ainda mais estranho: Isaac tinha asas. Asas brancas, grandes e belas que escapuliam de suas costas, como se não coubessem mais no espaço restrito dentro de seu corpo. Elas então se expandiram ainda mais, e ela conseguia ver o brilho ofuscante que emitiam. Emma não conseguia acreditar em nada daquilo, mas tinha certeza de uma coisa: Isaac teria muito o que explicar quando chegasse em casa. E o pior é que ela não sabia se teria coragem para escutar até o final.

Enquanto eles subiam, cada vez mais alto, Emma se permitiu olhar para o infinito que se erguia a sua frente, e por uma fração de segundos sentiu medo do que os aguardava ao fim do horizonte. Mas no fundo do peito sabia que, se Isaac estivesse ao seu lado, ela seria capaz de vencer o mundo. Porque ele a fazia sentir que o impossível era apenas uma barreira pequena para atravessar.

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