Parte XXXI

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Últimos capítulos

Rafaella

Eu estava prestes a enlouquecer. Uns idiotas falavam um por cima do outro em minha frente e outra estava simultaneamente traduzindo tanta asneira que por alguns minutos eu realmente considerei se havia necessidade de ter tímpanos, o que me levou inclusive a girar a taça entre os dedos imaginando o quão prejudicial poderia ser enfiar vinho em meu ouvido até que eu fosse incapaz de ouvir o próximo machismo que Hadson ia dizer.

Era oficial. Não havia passado quinze minutos aqui e encontrava muito mais agradável beijar um homem que precisar passar mais quinze minutos aqui e olha que para chegar nesse ponto eu teria que estar demasiado cheia daquelas conversas que me tinham como coadjuvante porque a verdade é que não importa o quão bonita uma mulher é, na visão de um que acredita ser superior ela sempre será o típico objeto de decoração sentada a mesa sem dizer uma palavra. E eu estava cansada.

Propositalmente derrubei um garfo no chão ao depositar sobre a mesa a taça de vinho e me abaixei com um pedido falso de desculpas apenas para contatar aquela lesma que falava ao meu ouvido com mais privacidade.

- Como sou eu que estou aqui eu decido o momento oportuno de virar a mesa. E é agora - Disse de uma vez.

- Eu não iria contesta-la - Me respondeu direta.

- Óbvio. Afinal você ainda tem em seu coração a ilusão de ser convidada ao casamento, o que não vai acontecer - Entreguei matando suas esperanças estapafúrdias.

- Eu convidada ou o casamento? - Teve a audácia de questionar.

- Você convidada - Disse o primeiro que me veio a mente apenas para que pudesse voltar a estar devidamente sentada e ereta, fazendo minha melhor cara de mulher séria e matadora o que não era um esforço já que passei toda uma refeição querendo comer cinco fígados com Cremeé Brullé.

De início de nada adiantou a minha expressão fatal e acabei por me frustrar um tanto o que me levou a morder mais um pedaço do meu pettit gateou entendendo que sequer poderia fingir certa elevância ao fazê-lo, pois até para um falso acordo tão baixo uma mulher precisava ser incisiva ao chamar atenção.

Apenas naquele breve segundo alcancei entender com totalidade o sentimento de Bianca em relação aqueles homens odiosos, evocando seu nome ao mesmo momento que encontrei seu olhar confundido.

Certamente não entendia nada, e eu não queria que se sentisse assim, se eu literalmente não enfiei um garfo nos olhos de alguém até o presente momento era porque eu a queria comigo e em paz com tudo o que sempre lutou.

- Confie em mim - Falei diante dos seus olhos incertos com certos sinais da nossa última conversa e Bianca assentiu que sim, sabendo que eu não iria defrauda-la.

Porque não importava quando parecesse que não, não importava nossas brigas ou problemas, porque nos amávamos nada poderia se interpor entre nós duas, eramos só nós duas e impulsionada por essa força eu arrematei contra a mesa com uma mão depois de dizer um agora disfarçado com um pigarro tomando a atenção de toda mesa.

- Cessons de prétendre qu'il est possible d'être cordiaux les uns envers les autres. Je ne peux pas les supporter et, même si je peux sembler bien à tes yeux, je suis sûr de ne pas les aimer non plus. Alors, pourquoi ne le résolvons-nous pas une fois pour toutes et évitons-nous le déplaisir d'être l'un en face de l'autre? - Eu não tinha idéia das palavras que custosamente reproduzi, entretanto, por quão surpresos terminaram tinha certeza que Gi havia escolhido as palavras certas.

Tradução: Paremos de fingir que há qualquer possibilidade de ser cordial uns com os outros. Eu não os suporto e por mais que eu possa parecer de boa aparência aos seus olhos tenho certeza que tampouco os agrado. Então porque não resolvemos isso de uma vez por todas e evitamos o desprazer de estar uns na presença dos outros?

Daquele momento em diante tomei a atenção deles, segui o roteiro e os deixei suando como se estivessem fazendo exercícios físicos, o que provavelmente não era o caso por muito tempo, e apenas quando os percebi acuados e assustados diante dos papéis sabia que era o tempo perfeito para dar o golpe final e conseguir o que queria desde que pedi que nos sentassemos na mesa deles ao invés da minha.

- Oui, j'ai des preuves qu'ils ont volé Marcos pendant des années. Cependant, je n'ai pas l'intention de les signaler, car maintenant que j'ai la garantie de me séparer de Bianca sans partir sans rien, je peux vous rejoindre au lieu de vous remettre - Eu disse sem saber do que se tratava outra vez para que ampliassem ainda mais seus olhos e vontassem a falar desesperadamente alto, de maneira que eu sequer entendesse o que Raúl estava dizendo do outro lado.

Tradução: Sim, eu tenho provas de que roubaram por anos. Entretanto, não pretendo denuncia-los, pois agora que tenho uma garantia para me separar de Bianca sem sair disso sem nada posso me juntar a vocês ao invés de entrega-los...

Porém, apenas até que eu escutasse um grito que ressoou pelo meu ouvido fazendo o barulho da mesa parar por um instante como eu própria.

E não somente porque acabei de ser pega, mas porque o havia sido por todas as pessoas a mesma vez.

- Merde - Soltou Petrix, o cabeça deles, se aproximando de mim e antes que pudesse chegar ao meu ouvido eu retirei o brinco e atirei dentro da minha taça de vinho diante do seu olhar furioso enquanto os irmãos acompanhavam sua reação agressiva diante de mim.

- Pute - Como a outra palavra essa sequer carecia de uma tradução, pois eu sabia exatamente o que estava dizendo, mas não me exasperei, vindo de alguém como ele era como se fosse um elogio. Inclusive, não lembrava de uma mulher realmente forte que não tenha escutado isso na vida.

- E você. Vocês aliás, são uns porcos ladrões, tenho nojo de vocês - Disse sem que pudessem entender acompanhando como sua respiração subia e baixava diante do meu queixo altivo que o olhava desde cima, com meus olhos queimando em ódio.

Sabendo que as palavras não alcançariam expressar minha indignação nesse segundo tudo o que fiz foi somente inclinar-me na direção da mesa e tomar o fim do meu doce.

- E se tanto gostam de tomar algo que não os pertence podem ficar com isso aqui. Presente meu - Falei esfregando a sobremesa da sua papada até as sombrancelhas, o máximo de agressão que eu poderia chegar em público sem receber um processo.

Em resposta o homem apenas parou por uns segundos e também se inclinou em direção a mesa tomando um pedaço da sua torna de morangos, fazendo menção de me atingir e falhando miseravelmente quando eu desviei do seu ataque fazendo com que a torta voadora terminasse atingindo seu próprio irmão o que desencadeou uma catástrofe incalculável, pois de direções erradas, vinganças fugazes e sobremesas que ganhavam asas o salão se tornou um campo de batalha de funcionários e patrões, convidados e inoportunos, todos eles unidos pela mesma vontade de participar de uma cena de novela das seis só que na vida real.

Ainda conseguindo me manter limpa consegui me deslocar até atrás de uma mesa, atirando torta que eu não sabia de onde vinha até o outro lado depois de um tempo não sei por qual motivo.

Acontecia que no momento que me senti mais segura veio o duro golpe, uma mão masculina tocou meu ombro e eu me arrepiei começando a rezar naquele instante a tudo quanto é santo mineiro até que escutei um risinho conhecido.

Quando me virei em sua direção recebi um prato de tiramisù bem em meu rosto.

- Gizelly... - Gritei procurando minha própria munição, mas percebendo que havia terminado sem nenhuma depois de usa-la sem razão - Não se supõe que somos da mesma equipe? - Indaguei.

- E somos. Mas eu realmente queria que sentisse o bom gosto do doce antes dos nossos minutos finais - Porque o que de fato nos pegaria fatalmente sequer era uma tortada na cara e sim a mulher localizada atrás dele com o rosto tão sujo que apenas dava para se ver os olhos de inferno faiscando como se pudesse fazer o tiramisù escorrendo do meu rosto derreter apenas com mante-lo.

Acho que usei das minhas rezas cedo demais...

Deliciosamente proibido  -  Versão RabiaWhere stories live. Discover now