Prólogo

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PRÓLOGO

(Salém, 02 de fevereiro 1692)

 As botas enlameadas esmagavam impiedosamente os cascalhos no chão, à medida que o rapaz avançava a passos firmes floresta adentro. Seus olhos atentos buscavam inimigos ocultos nas sombras, enquanto a mão dentro do bolso de seu comprido casaco se agarrava firmemente a uma arma de fogo. Já estava anoitecendo, e ele sabia que aquele era o horário onde sua própria visão poderia lhe pregar peças, mas ele confiava em seus instintos para que o mantivessem a salvo. Ele não sabia por que, de repente, se sentia compelido a estar ali, naquele lugar tão sombrio. Algo lhe dizia que, o que ele procurava, mesmo sem saber exatamente o que era, iria encontrar logo que avançasse mais alguns passos.

Estando novamente naquele lugar, era difícil as memórias não lhe assaltaram a mente. Há uma semana, ele tinha estado ali, com a mesma arma na mão. Porém, o inimigo tinha aparecido tão logo ele avançou alguns metros. O inimigo veio em forma de Jonathan Montgomery, um homem de mais ou menos a sua idade, magro e com as feições endurecidas pela vida de camponês. Mas ele sabia que Jonathan não era apenas um camponês. Ele sabia exatamente o tipo de pessoa que ele era. E foi por isso, que um segundo depois da aparição de Jonathan Montgomery, sem hesitar sequer um segundo, ele sacou sua arma e lhe deu um tiro certeiro no peito.

Então, ao mesmo tempo em que o homem tombava com um baque surdo no chão, um grito agudo e feminino emergiu das sombras. Ele viu uma mulher mais velha, com os olhos arregalados. Sua expressão era de puro terror ao olhar para o corpo de Jonathan, mas quando encarou o rapaz de pé, seus olhos emanavam o mais perigoso ódio que ele jamais havia visto antes.

Segurou sua arma e apontou para ela, mas num piscar de olhos, a mulher havia desaparecido. Ele tentou, em vão, procurá-la um tempo depois, mas não havia sinal de que ela sequer houvesse estado ali, com exceção do grito que ainda ecoava em seus ouvidos.

Sete dias depois do ocorrido, ele se encontrava de novo no mesmo local onde tinha assassinado a sangue frio um homem, e a culpa começava a querer lhe corroer a consciência. Mas ele não deixou.

Sua mãe lhe havia ensinado que matar era um pecado imperdoável, e que ele jamais deveria sucumbir e tornar-se um assassino. Mas ele não tinha escolha. Pessoas como Montgomery feriam outras pessoas. Eles eram maldosos, cruéis e nada podia detê-los, exceto a morte. Assim, se ele não matasse Jonathan, ele seria responsável pelo sofrimento de outras pessoas inocentes.

Ele tinha sido treinado pra isso. Claro que o melhor seria levá-lo à forca, ou para ser queimado, todas as pessoas do povoado podendo saber quem Jonathan Montgomery realmente era. Mas ele não tinha reforços. Ele estava por si só, e não podia se dar ao privilégio de hesitar.

Feiticeiros. Isso era o que gente como Jonathan era. E precisavam ser exterminados. Por pessoas como ele, caçadores. Ele era um caçador, um caçador de bruxos. Jonathan Montgomery tinha atravessado seu caminho, e ele tinha saído como vencedor.

Continuou fazendo seu caminho a passos firmes e, mais uma vez, tratou de convencer a si mesmo que tinha feito a coisa certa. Parou por algum tempo, e seus olhos se focaram no céu parcialmente escurecido, onde algumas estrelas já começavam a brilhar e a lua nascia ao leste. Sua intenção era tirar um breve momento de reflexão sobre o rumo que tomara sua vida, mas um ruído fez com que ele se voltasse à realidade bruscamente.

Sua mão se apertou ao redor da arma que ainda estava em seu bolso, enquanto ele avançava em direção ao ruído. Ele não sabia distinguir o que era aquele som, mas lhe lembravam sussurros. Ouvir aquilo fez um alerta de perigo disparar dentro de sua cabeça, mas ele o ignorou e continuou caminhando ao que parecia ser a direção certa.

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